quinta-feira, dezembro 27, 2007

A Bússola de Ouro


Sinceramente, eu gostaria de comentar algo que me incomoda no cinema atual antes de falar qualquer coisa sobre A Bússola de Ouro (The Golden Compass, 2007), a adaptação do primeiro livro da série Fronteiras do Universo, de Philip Pullman.

Sinto falta de verdadeiros autores e de trilhas sonoras marcantes. John Ford disse uma vez que era "diretor de westerns". Sergio Leone também fazia westerns. Alfred Hitchcock viajava pelo suspense. David Lean fazia épicos megalomaníacos. Está certo que alguns grandes diretores conseguiram imprimir suas marcas em gêneros distintos como é o caso de Martin Scorsese, Steven Spielberg, Sidney Lumet, Stanley Kubrick, Sam Peckinpah, entre outros. Mas, hoje, autor mesmo... deixe-me ver... talvez Quentin Tarantino, Tim Burton, os irmãos Coen... Woody Allen, claro. O que quero dizer é o seguinte: alguns cineastas rendem mais quando se comprometem com um tipo específico de gênero, onde eles sentem mais liberdade e criatividade para contar uma história.

Dentro da fantasia, Spielberg sabe o que faz. Peter Jackson é outro. Tim Burton também. O que sinto falta neste A Bússola de Ouro é a presença de um diretor que ame a fantasia. O que o livro de Philip Pullman não precisa é de um roteiro adaptado jogado nas mãos de qualquer diretor. Ou de qualquer estúdio. Pobre Chris Weitz. Ele até se esforça, mas o resultado é burocrático. Bem sabe ele que se não fosse o próprio a dirigir A Bússola de Ouro, a New Line teria colocado a batata quente nas mãos de outro operário padrão. Talvez Weitz tenha algum apreço pela obra de Pullman e aceitou o desafio.

Chris Weitz veio de comédias como American Pie e Um Grande Garoto. Por que, então, ele tentou trilhar pela fantasia? Veja o caso de Peter Jackson, por exemplo: antes de O Senhor dos Anéis e King Kong, ele fez um filme trash aqui e outro ali, e depois realizou Almas Gêmeas. Todos com um pé na fantasia. Seu próximo fime, Uma Vida Interrompida, também tem a cabeça nas nuvens.

Enfim, A Bússola de Ouro é um filme sem magia com uma história rica contada às pressas. O resultado é frio, sem emoção alguma. Tudo parece muito rápido e jogado na tela. Uma cena é colada na outra sem a mesma intensidade da anterior - quero dizer que a emoção que começa a ser construída não é passada adiante. Parece que todo o material do livro foi condensado com a preocupação de explicá-lo aos desavisados, mas a impressão que fica é que faltam peças no quebra-cabeças. Não sei o que os fãs vão dizer, mas os iniciantes na história de Pullman têm tudo para tirar uma soneca no cinema.

Não há tempo para desenvolver os personagens nesta correria desenfreada. É muita informação em pouco tempo para situar o espectador neste mundo mágico. Fiquei com a sensação de que (tirando Dakota Blue Richards, que interpreta a heroína Lyra Belacqua) o elenco está ali para se divertir num filme que não é "sério". Talvez seja o resultado da edição, mas Nicole Kidman, Eva Green e Daniel Craig (grandes nomes do momento em Hollywood) são estranhamente desperdiçados. Nicole poderia render uma vilã inesquecível, mas tem pouco tempo para brilhar. A única relação que recebe uma atenção maior de Chris Weitz é a de Lyra com o urso polar Iorek Byrnison (voz de Sir Ian McKellen). Tanto é verdade que a luta entre o animal contra outro urso gera a cena mais emocionante do filme.

Nem vou comentar sobre a trama, porque não vale a pena. Se você quer conhecer a saga Fronteiras do Universo, compre os livros. É muito mais negócio. Claro que o filme não é de todo ruim. Os efeitos visuais, a fotografia, a direção de arte e os figurinos são competentes. A Bússola de Ouro é visualmente muito bonito, afinal tem Nicole Kidman, e essa Dakota Blue Richards é um achado. Mas sabemos que um bom filme não precisa somente de adornos.

Voltando à questão da trilha sonora, que ainda não comentei, acho que um material capaz de render um filme grandioso (épico ou não) é motivo de sobra para inspirar uma trilha instrumental bela e marcante. David Lean tinha essa parceria com Maurice Jarre. Sergio Leone com Ennio Morricone. Temos Steven Spielberg com John Williams, e Alfred Hitchcock com Bernard Herrmann. Não peço necessariamente uma parceria, mas onde estão as trilhas para entrar na história do cinema? Será que os cineastas não se preocupam mais com esse "detalhe"? Muitas vezes, a música é uma personagem do filme, mas Hollywood anda esquecendo disso. Hoje, temos Gustavo Santaolalla fazendo ótimos trabalhos em Brokeback Mountain e Babel. Mas além dele, quem mais se preocupa com a boa e velha trilha sonora no cinema? Esse é outro problema de A Bússola de Ouro: o compositor francês Alexandre Desplat já foi mais inspirado em trabalhos anteriores.

A Bússola de Ouro (The Golden Compass, 2007)
Direção: Chris Weitz
Roteiro: Chris Weitz (Adaptado do livro de Philip Pullman)
Elenco: Dakota Blue Richards, Nicole Kidman, Daniel Craig, Eva Green e Sam Elliott

7 Comments:

At 1:08 AM, dezembro 28, 2007, Anonymous Anônimo said...

Não espero muito do filme. Não li os livros e só me interessei pelo elenco. Sua crítica não foi animadora, hehe, mas devo conferir este final de semana.

Acho que realmente faltam diretores visionários hoje no cinema. São poucos, como voce diz, que realmente transmitem emoção e em muitos casos, magia. Acho que os que voce mencionou, Spielberg, Jackson, Burton e Scorsese, são mestres nisso, mas faltam mais.

Sobre as trilhas, também concordo, mas juro que esperava mais um trabalho ótimo de Desplat, que realizou outras duas belíssimas trilhas neste ano, sendo a de O Despertar de Uma Paixão uma na qual encaixa muito bem no que voce disse, sobre ser um personagem do filme.

Ciao!

ps: e parece que o GRANDE retorno que Kidman nunca irá acontecer né? Torço muito por Margot at the Wedding. Baumbach já se mostrou excelente, vamos ver o que faz agora...

 
At 11:00 AM, dezembro 28, 2007, Blogger Kamila said...

Otavio, não senti toda essa pressa no desenvolvimento da história até o final, quando a Lyra descobre sua origem e revela seus planos para o garotinho Roger.

Também achei que, com a exceção de Lyra e do urso polar cachaceiro, o desenvolvimento dos personagens foi péssimo. Isso se nota nos casos de Lorde Asriel, Marisa Coulter e da feiticeira interpretada por Eva Green - que pouco têm a fazer.

Acho que os elementos bons desse filme são a direção de arte, efeitos visuais e figurinos; bem como Dakota Blue Richards, que surpreende.

Beijos.

PS: Wally, pelo jeito, o grande retorno de Kidman fica para 2008, quando ela se reúne novamente com Baz Luhrmann para AUSTRALIA.

 
At 3:31 PM, dezembro 28, 2007, Anonymous Anônimo said...

Tenho uma opinião semelhante, afinal esperava bem mais. Isso que você comentou a respeito do diretor é bem certo mesmo, afinal aposto que a trama renderia mais nas mãos de um Spielberg, por exemplo - ou mesmo um Cuarón, que deu um novo tom à série "Harry Potter". Tecnicamente é impecável, mas nunca encanta como deveria.

Considero a Nicole a melhor do elenco, pena que seu tempo seja limitado (some no meio do filme e só volta lá no final, não entendi muito bem isso, inclusive pensei que sua personagem era uma das protagonistas). Acho ótimo se discutir sobre trilhas sonoras, pois atualmente está complicado encontrar algo memorável no cinema. Adoro o Desplat, mas também não vi tanta inspiração na música de "A Bússola de Ouro".

Abraço!

 
At 6:42 PM, dezembro 28, 2007, Blogger Romeika said...

Otávio, essa sua resenha está maravilhosa. Concordo principalmente com a observação mais do que pertinente que vc fez antes de resenhar o filme, é a mesma coisa que passa pela minha cabeça ao sair de uma sessão como a de "A Bússola de Ouro". Eu gostei do diretor em "O Grande Garoto", mas jogar ele pra dirigir um filme desse calibre é uma decisão incompreensível do estúdio.

Tb sinto falta desses filmes com uma marca de um autor. Acho que se faz o que se sabe fazer, mas na Hollywood caça-níquel, nem toda decisão é pensada do ponto de vista artístico.

E o filme é isso mesmo, tem aquele deleite visual, uma protagonista carismática e talentosa, a cena fuderosa entre os ursos polares e é só. A trilha musical é bem esquecível, superfraquinha...:-S

Beijos! ^^

 
At 9:37 PM, dezembro 29, 2007, Blogger Otavio Almeida said...

Wally, na verdade, não aprecio muito o trabalho do Desplat.

Kamila, urso polar cachaceiro foi engraçado...

Vinicius, falta magia ao filme.

E, Romeika, muito obrigado!

Abs a todos!

 
At 7:06 PM, dezembro 30, 2007, Blogger Wanderley Teixeira said...

A trilha de Desplat para A Bussola de Ouro naum [e a melhor da carreira do compositor, mas achei bastante agradavel, muito mais do q esperava.E concordo contigo quando fala da falta de originalidade, de autores.Quanto a adapta;'ao de A Bussola de Ouro, achei bastante agradavel e satisfatoria.Bem superior a xerox de O Senhor dos Aneis, As Cronicas de Narnia.

 
At 8:31 PM, dezembro 30, 2007, Blogger Otavio Almeida said...

Xerox de O SENHOR DOS ANÉIS, Wanderley? Desculpa, mas vc leu os livros? Ou confundiu com HARRY POTTER?

Abs!

 

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