quinta-feira, janeiro 31, 2008

Onde os Fracos Não Têm Vez


No sufocante cenário ensolarado do Texas, o veterano do Vietnã Llewelyn Moss (Josh Brolin) encontra uma maleta com US$ 2 milhões e é perseguido por um misterioso assassino chamado Anton Chigurh (Javier Bardem). Enquanto isso, o xerife Ed Tom (Tommy Lee Jones) segue o rastro de sangue e destruição deixado pela caçada.

Tire o calor do Texas e coloque o frio de Dakota do Norte. Substitua o xerife desiludido de Tommy Lee Jones pela policial grávida de Frances McDormand. No lugar da valise cheia de dinheiro, lembre-se do seqüestro da esposa de Jerry Lundegaard (William H. Macy). Estamos falando de um filme dos irmãos Joel e Ethan Coen. Porém, não de Fargo 2, mas de Onde os Fracos Não Têm Vez (No Country For Old Men, 2007). Depois do fiasco Matadores de Velhinha, voltar ao velho universo Coen de Gosto de Sangue e Fargo parecia a solução ideal da dupla para acertar na mosca.

Nos melhores filmes dos irmãos Coen, a sociedade americana é retratada como o caos. Em qualquer canto da nação, existem tipos ingênuos e bizarros em uma constante disputa violenta gerada pela ganância. Os Coen sempre tiveram uma habilidade incrível para contar suas histórias de forma irônica - seja em dramas ou comédias. Eles utilizaram um humor refinado e incomum para os anos 80 (e início dos 90) para influenciar uma geração de cineastas e roteiristas. Um drama dos Coen nunca deixou o senso de humor de lado. E nem a mais escrachada comédia com a assinatura dos irmãos conseguiu abandonar o drama.

E um fato interessante nos grandes filmes dos Coen é que eles saíram de seus próprios roteiros originais. Foi assim em Gosto de Sangue, Arizona Nunca Mais, Barton Fink, Na Roda da Fortuna até chegar ao clímax criativo da dupla no extraordinário Fargo. Por este último, eles ganharam o Oscar de Melhor Roteiro Original. Mas, depois disso, a criatividade foi desaparecendo aos poucos. Será que os Coen foram vítimas da maldição do Oscar? Suas idéias extremamente originais ficaram perdidas no tempo - eles chegaram até a recorrer aos serviços de outros roteiristas no sofrível O Amor Custa Caro, além de apelar para a tosca refilmagem Matadores de Velhinha, o pior filme dos cineastas.

Aparentemente, eles continuam sem idéias. Agora, partiram para a adaptação do livro de Cormac McCarthy, que realmente tem muito da atmosfera de Fargo. Parece que os Coen andam atrás de inspiração - algo que vinha naturalmente de suas mentes no início da carreira. Mas o que era original passou a ficar repetitivo. O que me empolgava em termos de narrativa, agora me cansa.

Até que o início do filme é promissor. Com a ajuda da fotografia do mestre Roger Deakins, os Coen narram a trama com movimentos lentos de câmera, pouquíssimos diálogos, muita imagem e nenhuma música. É um recurso interessante para o cinema atual e para uma dupla que já usou e abusou de cortes rápidos ao explorar a velocidade da imagem. É um elemento que reforça a tensão. Há uma cena impressionante que demonstra o que quero dizer: Llewelyn tenta fugir de um cachorro enquanto nada para a outra margem de um rio. É um sofrimento silencioso. Assim como tantas outras, a cena é muito bem filmada. Outro momento angustiante é o tiroteio entre Chigurh e Llewelyn, que começa num hotel e termina na rua. Mais uma vez, os Coen mostram como se monta um filme para alcançar o tom ideal pretendido pela história.

Gosto do filme até seus 20 minutos finais, quando há uma reviravolta chocante. Muitos acham que o que vem na seqüência é mais uma demonstração da genialidade dos Coen, mas não me empolguei. Tudo caminhava para um clímax de arrepiar, afinal a tensão cresce a cada cena. Mas a tal reviravolta aposta no anticlímax.

Entendo que a chave para compreender o final é o discurso inicial de Tommy Lee Jones, que interpreta tão bem o xerife Ed Tom Bell. Ele é um homem desiludido com os dias de hoje. O Velho Oeste se foi e ele não compreende como a violência tomou conta do mundo numa proporção assustadora. Bell nem gosta de segurar uma arma de fogo. Ele diz que seus antepassados resolviam muitos crimes sem disparar um tiro sequer. Ok. Os tempos mudaram e a violência anda por um caminho interminável. E o título original No Country For Old Men explica tudo. Mas será que precisamos de um filme inteiro para entender esse sentimento do xerife?

Ao menos, o elenco faz sua parte. Tommy Lee Jones está magnífico, Javier Bardem está monstruoso como um assassino, que parece vilão de história em quadrinhos, e Josh Brolin se esforça bastante. Eles são o trio The Good, The Bad & The Ugly, respectivamente, dos irmãos Coen.

Talvez tudo seja uma grande brincadeira dos Coen. O problema é que muitos andam filosofando sobre o filme. Entre outras coisas, gostam de falar que o Anton Chigurh de Javier Bardem é o mal absoluto ou a Morte em pessoa, mas acho que quebrar a cabeça com "mistérios" neste filme é passatempo para pseudo-intelectuais.

A crítica americana está louca para reconhecer uma verdadeira obra-prima feita pelo cinemão. É algo que não acontece há muito tempo, mas dizer que esse filme é Onde os Fracos Não Têm Vez é algo como atirar para todos os lados. Imagino que os Coen estão rindo à toa, porque fizeram a maioria cair direitinho nesta piada. Talvez isso seja genial.

Onde os Fracos Não Têm Vez (No Country For Old Men, 2007)
Direção: Joel Coen e Ethan Coen
Roteiro: Joel Coen e Ethan Coen (Adaptado do livro de Cormac McCarthy)
Elenco: Tommy Lee Jones, Javier Bardem, Josh Brolin, Woody Harrelson, Kelly Macdonald e Garret Dillahunt

11 Comments:

At 5:50 PM, janeiro 31, 2008, Blogger Otavio Almeida said...

Caros,

Vi o filme duas vezes. Não deu. A crítica acima têm algumas novas opiniões minhas. Mas grande parte do texto é reaproveitado da minha primeira análise de ONDE OS FRACOS NÃO TÊM VEZ, de 31 de outubro de 2007, no encerramento da Mostra de SP.

Abs!

 
At 6:50 PM, janeiro 31, 2008, Blogger Pedro Henrique Gomes said...

Achei Onde Os Fracos Não Têm Vez o melhor de 2007. Já que Desejo e Reparação não me enganou, mesmo assim foi o segundo melhor, porém, acho que Sangue Negro deve ser melhor que ambos.
Javier Bardem está perfeito e foi o que mais me empolgou no filme.

Abraço!!

 
At 7:43 PM, janeiro 31, 2008, Anonymous Anônimo said...

Bem, vi o filme, gostei, mas não tanto. Primeiro: adoro esse estilo dos irmãos Coen mesmo que não pareça inovador nem nada, mas acho que eles têm alguns filmes melhores como "Gosto de Sangue" e o próprio "Fargo" - ainda sua única obra-prima. Segundo: estou em dúvida quanto ao desfecho. Se por um lado explica o título original e tem sim a ver com o filme (como você bem comentou), frustrou um pouco minhas expectativas. Não tenho nada contra esse tipo de final, muito pelo contrário, acho que em 2007 tivemos alguns finais pouco convencionais que me agradaram bastante ("Zodíaco", "Conduta de Risco", o próprio "Desejo e Reparação"), mas não funcionou da forma como deveria aqui. Diria que é um filme 5 estrelas até seus 3 minutos finais (e não vinte), pois a única cena que não achei tão boa foi a última mesmo.

Também vi "Juno" e gostei mais até, mas ainda prefiro outros dois na disputa. Por enquanto, meu ranking de indicados ao Oscar está assim:

1º Desejo e Reparação (9.0)
2º Conduta de Risco (9.0)
3º Juno (8.5)
4º Onde os Fracos Não Têm Vez (8.5 ou 8.0)

Só "Sangue Negro" pode superar o primeiro então. Ah, claro, preciso rever os últimos dois, especialmente "Juno", que me pareceu um filme excelente mas falho em alguns pontos. Até encaro uma segunda sessão de "No Country", mas acredito que terá o mesmo resultado que a sua (ou seja, minha opinião pouco deve mudar).

Abraço!

 
At 8:11 PM, janeiro 31, 2008, Anonymous Anônimo said...

Ah, uma coisa que esqueci de comentar. Se você pegar essa minha lista de preferências e virar de ponta cabeça, verá que é exatamente a mesma ordem de probabilidade dos filmes vencerem o Oscar...

 
At 10:33 PM, janeiro 31, 2008, Anonymous Anônimo said...

Não teve jeito hein? Vou tentar ve-lo, mas não sei se vai estreiar aqui amanhã.

Ciao!

 
At 1:03 AM, fevereiro 01, 2008, Blogger Otavio Almeida said...

Pedro, eu juro que tentei.

Vinicius, falo dos 20 minutos finais por causa da "morte" off-screen. Você sabe qual. E a cena final só pode ter sido feita para ser genial. Mas fiquei frustrado como você. E concordo sobre FARGO, embora ARIZONA NUNCA MAIS seja o meu preferido.

Wally, não é uma obra-prima. Você pode gostar do filme. Ou não. Mas obra-prima é... 2001, por exemplo. Ou TOURO INDOMÁVEL. E pegue os filmes dos Coen, por exemplo... FARGO é melhor. E não chegou ao Oscar como favorito.

Abs!

 
At 1:04 AM, fevereiro 01, 2008, Blogger Otavio Almeida said...

Ah, acabo de ver SWEENEY TODD... É uma vergonha saber que Tim Burton ficou de fora do Oscar.

Abs!

 
At 11:53 AM, fevereiro 01, 2008, Anonymous Anônimo said...

Otavio, esse filme nem estreou por aqui. Não gosto de "Fargo" e como também não sou fã dos irmãos Coen acho que meu olhar em cima do filme vai ser bem diferente. Acho que existe muita paixão por parte dos críticos na hora de analisar obra de cineastas-realizadores como os Coen e PT Anderson - só para citar dois exemplos que veremos na festa do Oscar 2008.

Beijos! Bom Carnaval!

 
At 10:22 PM, fevereiro 01, 2008, Blogger André Renato said...

Acho este filme uma coisa genuína. Mas entendo (e já vi) esse negócio de a crítica ou o público cinéfilo caírem em armadilhas pseudo-ntelectuais de filmes ou diretores pseudo-geniais. Pra mim, é isso o que acontece com Tarantino (Kill Bill), Lars Von Trier (Dogville), os irmãos Wachownski (Matrix), etc. "Onde os fracos..." pode também ser uma enganação, mas com certeza é bem mais sutil e bem elaborada (sem querer dizer que é mais culta) do que os exemplos acima... Abraços!

 
At 11:23 PM, fevereiro 01, 2008, Blogger Otavio Almeida said...

Bom, Andros. Concordo com vc. Impliquei com algumas coisas no filme. Mas sei que ele tem qualidades.

E tb prefiro os Coens aos nomes citados por vc.

Abs!

 
At 8:02 AM, maio 17, 2013, Anonymous Anônimo said...

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