sexta-feira, janeiro 25, 2008

O Gângster


Entre outras coisas, os anos 70 representaram o fim da inocência. A Guerra do Vietnã veio para fazer o povo americano questionar as decisões de seus governos e as drogas viraram um negócio lucrativo, que aumentou a criminalidade, a desordem social, o caos urbano, a corrupção na polícia e nos altos escalões da justiça. A violência reinava absoluta.

Neste cenário infernal, alguns cineastas corajosos e talentosos abordaram esses temas ainda naquela década. O resultado desta análise inclui filmes memoráveis como O Poderoso Chefão, Scarface, Serpico, Um Dia de Cão e Operação França. Pensando nisso, e no artigo The Return of Superfly, de Mark Jacobson para a New York Magazine, em 2000, o diretor Ridley Scott filmou a verdadeira saga de Frank Lucas (Denzel Washington), que passou de fiel guarda-costas, e comparsa do líder do Harlem na época, a chefão do império das drogas. Em O Gângster (American Gangster, 2007), Ridley Scott mostra que o trabalho de Lucas não é pessoal. São apenas negócios e nada mais. Ou seja, se as drogas entram na casa de pessoas inocentes, isso não é problema dele. É um negócio como outro qualquer.

No entanto, alerto para um certo cuidado antes de assistir ao novo Ridley Scott: as sinopses espalhadas por aí contam o filme inteiro. Bom, a grande sacada do roteiro de Steven Zaillian (A Lista de Schindler) é mostrar essa ascensão de Frank Lucas com muita calma e paciência - exatamente como era feito no cinema dos anos 70 - em paralelo aos dilemas do policial Richie Roberts (Russell Crowe). Sem a presença de Roberts, acho que o filme cairia no lugar comum. Enquanto o bandido Lucas ergue seu império do tráfico com genialidade e une cada vez mais a sua família, o tira Roberts paga o preço por sua honestidade (assim como o Serpico de Al Pacino no filmaço de Sidney Lumet) e anda pelo caminho da solidão.

Aos poucos, Roberts tem a chance de se "redimir" ao liderar uma equipe, que investiga a origem de uma perigosa droga que está em todos os cantos. Ninguém suspeita de Frank Lucas, porque ele fica no low profile. Dessa forma, comendo pelas beiradas, ele se torna mais poderoso do que a decadente máfia italiana, que fica aos seus pés. E neste cenário preconceituoso e intolerante, a lei jamais desconfiaria de um negro.


O ingresso vale cada centavo, principalmente, pela atuação da dupla principal. Não concordo quando dizem que Denzel ganha de lavada de Crowe. Seu Frank Lucas, acho, é um personagem mais fácil. O grande Denzel já mostrou antes que sabe passar de simpático a monstro num piscar de olhos como em Dia de Treinamento. E ele repete a técnica em O Gângster. Já não sabemos o que esperar do Richie Roberts de Russell Crowe, um policial honesto até o último fio de cabelo, mas incapaz de manter relações humanas e de ser fiel às próprias mulheres de sua vida. Seu conflito é saber que na terra, ele é bom, mas no céu, ele precisará acertar contas.

Quem procura por ação e muitos tiroteios, pode se decepcionar com O Gângster. É bom cinema que dá voz a dezenas de personagens e aposta no poder da narrativa. Nesse ponto, as contribuições de Denzel Washington e Russell Crowe elevam a qualidade de um filme que parece que já vimos antes. É isso mesmo. O problema de O Gângster é parecer um pouco over, datado. E a trama é detalhada demais, por vezes até muito didática.

Além disso, O Gângster tropeça também no que poderia ser a parte mais interessante a ser contada, que surge no final. Ridley Scott leva cerca de duas horas para chegar ao embate entre Crowe e Denzel, aí resolve correr nos minutos finais e encerrar tudo com aquele bom e velho texto que explica os destinos dos personagens na última cena.

Enfim, são pequenos detalhes que não deixam O Gângster no patamar de clássicos como O Poderoso Chefão, Scarface, Serpico, Um Dia de Cão e Operação França. Esqueci algum? Pode ser, mas garanto que o filme em questão também supera O Gângster.

O Gângster (American Gangster, 2007)
Direção: Ridley Scott
Roteiro: Steven Zaillian
Elenco: Denzel Washington, Russell Crowe, Chiwetel Ejiofor, Josh Brolin, Ruby Dee, Lymari Nadal, Ted Levine, RZA e Cuba Gooding Jr.

13 Comments:

At 2:53 PM, janeiro 25, 2008, Anonymous Anônimo said...

Puxa, que filme ruim, sem dúvida a maior decepção de 2007 até agora - se tivesse que escolher o filme mais superestimado do ano, "O Gângster" estaria em primeiro lugar. Apesar de você ter gostado, concordo com alguns pontos de seu texto. Russell Crowe dá um pouco de dignidade à fita e está MELHOR do que o Denzel Washington; é o filme mais datado da temporada, cheira até a poeira; o desfecho é muito fraco; qualquer um desses filmes citados é infinitamente superior a ele.

Abraço!

 
At 3:01 PM, janeiro 25, 2008, Blogger Otavio Almeida said...

O filme é bom, Vinicius. Mas não é um grande Ridley Scott, pois cheira a poeira (como vc disse). E o desfecho é sem sal.

Concordo que o Russell Crowe surpreende mais que o Denzel Washington.

Mas não concordo quando alguns comparam O GÂNGSTER a OS INFILTRADOS. A comparação deve ser feita com os filmes policiais dos anos 70, que são superiores.

Abs!

 
At 3:07 PM, janeiro 25, 2008, Anonymous Anônimo said...

Ah, Otavio, outra coisa que esqueci de comentar: o que dizer da Ruby Dee, hein? Sua indicação ao Oscar foi o absurdo dos absurdos dessa edição.

 
At 3:57 PM, janeiro 25, 2008, Blogger Museu do Cinema said...

Vejo esse na segunda amigo. abs

 
At 4:29 PM, janeiro 25, 2008, Blogger Kamila said...

Vou assistir "O Gângster" amanhã e comento seu post com calma depois.

Beijos e bom final de semana!

 
At 4:52 PM, janeiro 25, 2008, Anonymous Anônimo said...

Nossa, eu esperava mais. Vou tentar ver este fim de semana, mas não sei se vou conseguir entrar para ver, já que a censura é 18 anos e tenho apenas 16. Vamos ver...

Ciao!

 
At 6:21 PM, janeiro 25, 2008, Blogger gustavo said...

ainda nao chegou por aqui !!
Mas é o tipo do filme que eu assistiria mais no DVD...

 
At 11:51 PM, janeiro 25, 2008, Anonymous Anônimo said...

Gostei do filme, apesar do terceiro ato que é bem ruim, tentando transformar o traficante em uma espécie de herói. Mas o filme vale pelas atuações e a ótima direção do Scott, que compensa o roteiro capenga.

 
At 4:21 AM, janeiro 26, 2008, Blogger Ivani said...

Eu gostei do filme, mas concordo que o final me pareceu corrido.
A forma como Lucas gerenciava seus negócios é impressionante. Me fez lembrar das minhas aulas de marketing na faculdade, e ele não fez faculdade mas entendia muito bem das ferramentas de marketing.

Em tempo, segundo o CineTotal:
http://www.cinetotal.com.br/noticia.php?cod=1480
O Ministério da Justiça alterou a classificação do filmes, de 18 para 16 anos.

 
At 10:44 AM, janeiro 26, 2008, Blogger Otavio Almeida said...

Ainda mais depois de ter visto JUNO, tudo parece menor diante do filme do Jason Reitman...

Abs!

 
At 5:27 PM, janeiro 26, 2008, Blogger Kamila said...

Otavio, concordo que o filme tropeça no final, com aquela redenção toda para o Frank Lucas. Odiei!

No mais, gostei da paciência com que o roteiro do Steven Zaillian explica a ascensão do Frank Lucas, bem como a investigação de Richie Roberts.

Outros pontos altos do filme são a sua direção de arte, a fotografia e a edição.

Beijos.

 
At 10:14 AM, janeiro 27, 2008, Blogger Pedro Henrique Gomes said...

Esperava mais desse filme, porém gostei e assim como você disse, vale cada centavo.


Abraço!!!


OBs:Vou linká-lo no Tudo é Crítica.

 
At 6:46 PM, janeiro 28, 2008, Blogger Otavio Almeida said...

Valeu, Pedro! Coloquei teu link aqui.

Abs!

 

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