sábado, fevereiro 09, 2008

Inteligência perdida

Outro dia me perguntaram numa conversa de fim de expediente: "O que será que aconteceu com a mala de dinheiro de Onde os Fracos Não Têm Vez?"

Escrevendo neste espaço sabendo que o leitor está ciente da minha opinião sobre o novo, premiado e badalado filme dos Irmãos Coen, eu respondi: "Não sei." E voltei a degustar meus salgadinhos. "Como assim? Você não se importa?", desafiaram. "Não. É um MacGuffin. Nem os Coen devem saber", eu bati o pé. Mas o rapaz continuou: "Ora, mas é um filme que merece ser discutido, afinal os Irmãos Coen são intelectuais. Ou vai me dizer que não gostou?"

Senti que estava na hora de entrar na conversa, que antes era sobre um metido a intelectual ter dito no Congresso que To Be or Not To Be? era citação de Rei Lear. E eu disse: "O filme não me intrigou." Mas o rapaz insistiu: "Mas isso é um absurdo. Discordar de um filme assim é dar um fora como o To Be or Not To Be." Na mesma hora, uma amiga entrou na conversa: "Dizem que esse filme do Scorsese é bom, né?"

Enfim, para muitos, discordar da arte dos Irmãos Coen é blasfêmia cultural. É algo incompreensível como tentar entender Kléber Leite, o vice de futebol do Flamengo, fazendo proposta para o Romário às vésperas da estréia do time na Libertadores. Seria como atirar uma ou duas pedras no hall dos intelectuais. Já viu como se deve ter cuidado numa rodinha para assumir que não gostou de um filme do Woody Allen, por exemplo? Você sabe: o Woody Allen é um cara inteligentíssimo e não estou zoando. Portanto, você não tem o direito de dizer que não gostou de algo que ele fez. Assim como não podemos falar mal de uma produção européia da vez.

Pois é. Eu não gostei de Onde os Fracos Não Têm Vez, apesar de cultuar a maioria dos trabalhos de Joel e Ethan Coen. Mas é assim mesmo. Já cansei de defender Fargo entre meus amigos que não compreenderam a sua "genialidade". Pois bem. Agora é a vingança deles. Minha inteligência está em cheque. Anos e anos de aprendizado, afinal tive a oportunidade de estudar em boas escolas, jogados no lixo.

Acho que os Coen vão ganhar o Oscar de filme e direção mesmo. Mas antes que o pessoal do meu happy hour descubra isso - porque muitos desdenham de um filme quando ele é indicado ao Oscar -, é bom saber que os Coen não mudaram. Quem mudou foi a indústria. Viu só? Defendi os Irmãos Coen. Apesar do filme deles não terminar. E olha que foi preciso não um, mas dois irmãos para adaptar o livro de Cormac McCarthy às telas. Se o filme é como o livro, então, como os próprios Coen disseram numa entrevista sensacional para a Folha de S. Paulo, os méritos são todos do autor.

Esse papo de que "Fulano é intelectual" é tão relativo para mim. Talvez eu seja exatamente o oposto, ou seja, medíocre. Mas pessoas são apontadas como intelectuais na mesma proporção em que adoram descobrir novos craques do futebol mundo afora. E olha que alguns desses intelectuais marcados pelo público acabam apresentando Big Brother. Não entendo. Ou então, todos precisam se divertir. Ninguém precisa citar To Be or Not To Be? o tempo todo para provar sua inteligência. É para fazer algum sentido?

Outro dia mesmo eu tive dois sonhos. Os dois com o meu pai. O primeiro eu não me lembro muito bem, mas tinha a ver com ele me dando algum dinheiro. No segundo, eu assistia a cerimônia do Oscar com ele. Juno ganhou as estatuetas de Melhor Filme, Melhor Diretor, Melhor Roteiro Original e Melhor Atriz. Em seu discurso, o diretor Jason Reitman lembrou que Alfred Hitchcock e Stanley Kubrick morreram sem Oscar. E, então, eu acordei.

18 Comments:

At 1:46 PM, fevereiro 09, 2008, Anonymous Anônimo said...

Bem Otavio, adorei seu texto, hehehe, bem, digamos, cínico. Eu vi o filme ontém e ainda revira na minha cabeça. Sim, eu gostei muito. Mas muito mesmo! O último diálogo do filme (do qual voce resolveu mecher um pouco, hehe) achei brilhante. Mas é essa coisa, algumas pessoas não irão gostar do filme, e é fato. É assim com qualquer filme. Como dizem, vivem as diferenças né? Cinema é relativo. Voce pode ve-lo com vários olhares. E eu me irrito com a visão de certas pessoas sobre filmes, algo que que estas pessoas que mencionei chamam apenas de divertimento. Mas por mais "bem feito" que um filme seja, ainda terão os que irão contestar sua glória e e nesse caso, sua consagração. Eu entendo sua visão sobre o filme, li suas duas críticas e de nenhuma forma vou te ver como as pessoas que mencionei logo acima, sem senso crítico e que veem cinema como algo unidimensional. Voce simplesmente não gostou do filme como os outros, mas nem por isso desemereceu alguns de seus valores. Se seus "amigos" não entenderam isso, é a inteligencia deles que está perdida.

Ciao!

 
At 1:52 PM, fevereiro 09, 2008, Blogger Otavio Almeida said...

UAU! Obrigado, Wally! Mas ainda bem que não contei no texto que vou ver CLOVERFIELD neste final de semana.

Apesar de tudo, estou louco para ver BURN AFTER READING, o próximo dos Irmãos Coen.

Abs!

 
At 2:45 PM, fevereiro 09, 2008, Blogger R. said...

Sabe o que sempre faz me olharem torto? Eu dizer que Kubrick e Nicholson não me dão prazer nenhum (e em nenhum momento eu falo que são ruins). Eu digo isso e viro o ET da coisa.

A propósito: não gostei de Onde os fracos não têm vez, maaaas é um ótimo filme, apesar de tudo.


E, a propósito, adorei o texto. Principalmente o final =/

 
At 4:36 PM, fevereiro 09, 2008, Blogger Kamila said...

Fantástico texto, Otavio.

Eu não tenho medo de discordar dos chamados intelectuais. Tenho medo é de entrar na onda e achar tudo lindo porque todo mundo acha lindo.

Quando a opinião é bem fundamentada, não tem do que discordar. :-) O negócio, e aí é que fica difícil, é respeitar as opiniões diversas sobre um mesmo tema.

Beijos!

 
At 4:39 PM, fevereiro 09, 2008, Anonymous Anônimo said...

Nossa, eu também odeio esse tipo de coisa. O mesmo está acontecendo comigo em relação a "No Country", só porque é o que menos prefiro dentre os indicados ao Oscar principal - e olha que gostei do filme, mas querem que eu o considere uma obra-prima. Posso até ser medíocre, mas não mudarei minha opinião tão fácil... E o final do texto foi brilhante, hahaha.

Abraço!

 
At 5:12 PM, fevereiro 09, 2008, Anonymous Anônimo said...

Bom. Essa discriminação, no meu caso, vem com a minha indiferença crescente a "Desejo e Reparação". O mais irônico disso é que o final do filme é o impacto que eleva a consideração da maioria dos espectadores às alturas e foi exatamente o que me incomodou. Já em "No Country", o final foi extremamente significativo, poético até e não acho um ser vivo ao meu redor que não perceba que era, necessário até, um final daqueles depois de completada a missão dos Coen. Não os acho intelectuais, mas sim ótimos observadores, críticos sarcásticos da natureza humana que, vez ou outra, acertam a mão.

 
At 6:12 PM, fevereiro 09, 2008, Blogger Guilherme Costa said...

Eu tambem nao gostei de ONde os Fracos Não Têm Vez, e nem o achei genial! creio que todo o mérito do filme está no realismo das cenas violentas e nas atuações, mas o filme em si eu achei uma perda de tempo. Quem sabe eu nao tenha prestado atençao suficiente, ou nao compreendi as metaforas implícitas, mas sinceramente nao sei como podem considerar esse o melhor filme de 2007!

 
At 6:40 PM, fevereiro 09, 2008, Blogger Pedro Henrique Gomes said...

Sou suspeito, só vi Atonement, No Country for Old Men e Juno, mas por enquanto prefiro o filme dos irmãos Coen.

Grande abraço.

 
At 8:42 PM, fevereiro 09, 2008, Blogger Flávia said...

Quem nunca foi criticado por ter uma opinião diferente? Minha última experiência nesse sentido foi ter sido acusada de insensível por não ter chorado em "Ps Eu te Amo"...

Bjs!

 
At 11:37 PM, fevereiro 09, 2008, Blogger Otavio Almeida said...

Obrigado, amigos!

Todo mundo passa por isso, então. Estou mais tranqüilo agora... :)

Acho que o problema é acontecer uma unanimidade. E o importante mesmo é respeitar a opinião de cada um. Assim a gente conversa, troca idéias, e... aprende. É isso.

Abs!

 
At 4:03 AM, fevereiro 10, 2008, Anonymous Anônimo said...

De boas Otávio, como você pode não gostar de um filme sendo que você não o entendeu?

Se você não entendeu, é melhor rever antes de falar algo. Eu vi o filme, e ficou claro com quem ficou a mala. Se quiser eu falo ou tento explicar, mas pelo jeito nem te importa, já que o seu orgulho é bem maior...

E mecher com o monológo final do filme foi covardia e falta de carater, mostrando claramente que as pessoas que não entendem um filme e saem simplesmente xingando. Você me parece descer do nível de um crítico ou cinéfilo para uma pessoa comum que não gosta de algo que não entende.

Cresça um pouco e reveja o filme, quando entender - poste uma critica que preste (de algo que você tenha entendido).

Se você não entendeu, ao menos poderia ter sido humilde o suficiente de bater no peito e dizer isso, sem desmeretizar o filme e torcer para outro vencer em seu lugar.

Cresça e aprenda!

 
At 1:08 PM, fevereiro 10, 2008, Anonymous Anônimo said...

Porque não responde ao comentário acima?

Só sabe responder os comentários que elogiam?

 
At 1:41 PM, fevereiro 10, 2008, Anonymous Anônimo said...

Adoro esses comentários de "você não entendeu o filme". Claro, se você não gosta não entendeu.

Eu também não gostei tanto de No Country. Claro reconheço que o filme é bom e tal, só não gostei, e não daria o oscar pra ele.

 
At 1:52 PM, fevereiro 10, 2008, Blogger Otavio Almeida said...

Não fico no blog 24 horas por dia. Me parece que vc escreveu nesta madrugada. E eu estava dormindo.

Se você não "entendeu" o post, eu estava falando do assunto com bom humor. Respeito quem gostou do filme. Sei de gente que gostou de ONDE OS FRACOS NÃO TÊM VEZ, mas que não gostou de FARGO, que eu adoro. Enfim, cada um é cada um.

Já discuti vários filmes que gostei e não gostei. Agora, respondo a todos os leitores. Mas todos aqueles com educação. E é impressionante! Quando aparece alguém sem educação, essa pessoa nunca assina o nome... Quem aqui deve crescer e aprender?

Peço desculpas aos outros leitores pelo inconveniente.

 
At 1:53 PM, fevereiro 10, 2008, Blogger Otavio Almeida said...

E Julia, é verdade. Reconheço as qualidades do filme, mas já gostei mais de outros filmes dos Irmãos Coen.

E meu comentário acima é para o anônimo, ok?

Bjs!

 
At 3:11 PM, fevereiro 10, 2008, Blogger Flávia said...

Hahahahaaha! Essa foi boa... "descer do nível de um crítico ou cinéfilo para uma pessoa comum". Com ctz o tal "anônimo", se sente um ser superior, acima das pobres "pessoas comuns" que têm o direito de não entender e de não gostar de algo.

Amigo (a), aprenda a respeitar as opiniões dos outros, a escrever "mexer" corretamente e a assumir suas posições assinando seu nome!

 
At 9:20 AM, fevereiro 12, 2008, Anonymous Anônimo said...

Ridículo esse comentário desse tal anônimo. Se para gostar de um filme basta eu 'entendê-lo' então só vou ver filme da Xuxa agora. Não entendi 90% de 'Império dos Sonhos' e foi um dos meus filmes favoritos do ano passado. Eu gosto muito do 'Onde Os Fracos Não Têm Vez', sei lah se minha interpretação do filme é a 'correta', só sei q gostei. Se o Otávio não gostou não acredito que tenha sido porque ele não o entendeu. Cinema não é conta de matemática caramba!

 
At 10:59 AM, fevereiro 12, 2008, Blogger Otavio Almeida said...

É, Marcio! Às vezes, as pessoas mostram como são radicais. É por isso, por exemplo, que existe a violência. Seja no trânsito, ou em qualquer lugar, como brigas entre torcidas de futebol. Um verdadeiro absurdo. O Fluminense ganhou do Flamengo outro dia. E o que vou fazer? Bater em alguém?

Desse jeito, não você que gostou do filme... mas a torcida organizada de ONDE OS FRACOS NÃO TÊM VEZ gostaria de me dar uns cascudos :)

Abs!

 

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