WALL-E
WALL-E fala o esperanto do cinema
Na minha crítica para Ratatouille, em 2007, eu disse que a Pixar testava algo de novo para o cinema em termos de linguagem. Graças a WALL-E (WALL-E, 2008), não tenho mais dúvida que os criadores de Toy Story e Procurando Nemo têm um plano em andamento, mas ao contrário do que pensei em Ratatouille, não é exatamente novidade que eles buscam. A Pixar não quer mudar o cinema. Tecnicamente sim, mas a narrativa permanece clássica. Por amor à sétima arte, o estúdio quer fazer o público atual entender ou lembrar o que realmente significa o cinema.
Mas, no fundo, o que torna um filme bom? Ou melhor que outro? Será que pela divisão dos gêneros? Uma comédia precisar ser 100% comédia? Suspense tem de ser sempre suspense? Um filme não pode misturar gêneros? O Globo de Ouro divide suas categorias em drama e comédia, por exemplo. O fato é que os principais prêmios colocam seus selos de garantia em produções e separam atores principais de coadjuvantes, direção de roteiro, e aprendemos de forma errada o que é o bom cinema - por meio de números, efeitos visuais e prêmios.
Claramente, a Pixar está tentando dizer algo. O cinema evolui tecnicamente, mas a linguagem é a mesma. Eu captei da seguinte forma: cinema é linguagem. É uma forma de expressão. Não importam os gêneros. Não importa se é filme ou desenho. Não precisamos de palavras. Basta entender a linguagem universal que existe entre o amor, a esperança, a amizade e a arte.
Alguns acusarão WALL-E de hipocrisia, afinal a Pixar fala do excesso de consumo quando estamos numa indústria chamada Hollywood. Mas não é isso. Não é somente uma produção que carrega referências e mensagens ecológicas ou pacíficas. A verdade é que WALL-E tenta mostrar a uma nova geração o que os mestres dos primórdios da sétima arte tentaram nos ensinar. É aquela velha pergunta que volta de vez em quando em nossas mentes e corações: o que é cinema?
WALL-E (WALL-E, 2008)
Direção: Andrew Stanton
Na minha crítica para Ratatouille, em 2007, eu disse que a Pixar testava algo de novo para o cinema em termos de linguagem. Graças a WALL-E (WALL-E, 2008), não tenho mais dúvida que os criadores de Toy Story e Procurando Nemo têm um plano em andamento, mas ao contrário do que pensei em Ratatouille, não é exatamente novidade que eles buscam. A Pixar não quer mudar o cinema. Tecnicamente sim, mas a narrativa permanece clássica. Por amor à sétima arte, o estúdio quer fazer o público atual entender ou lembrar o que realmente significa o cinema.
A direção de Andrew Stanton é magnífica, o roteiro é irretocável e extremamente criativo, os personagens são cativantes, os efeitos sonoros são impressionantes, temos referências a diversos filmes clássicos e WALL-E é maravilhoso do início ao fim. Mas isso você já sabe. O que alguns talvez não entendam é que WALL-E não pode ser resumido com "simples" adjetivos.
Tentarei explicar: filmes de qualidade não deveriam ser divididos em gêneros (comédia, ficção científica, drama, suspense, etc). Os irmãos Lumière ensinaram, desde 1895, que o cinema é uma linguagem. É comunicação. Naquela época, os filmes eram mudos - gestos e olhares eram mais fortes que qualquer palavra. Não importa se temos um desenho ou um filme com atores de carne e osso. Ou se o filme se mistura com animação. Tudo é uma língua só. Os Lumière sabiam disso. Mas, aos poucos, as pessoas esqueceram seus ensinamentos. Talvez, a trama de WALL-E seja uma metáfora para isso.
Hoje, o que importa é o dinheiro. Na vida real e no cinema. O importante é que uma produção faça milhões em seu final de semana de estréia. O que vale é um filme cheio de ação e efeitos visuais - de preferência com atores milionários berrando, atirando, batendo e correndo na tela. É o que os estúdios (e o público) querem. Infelizmente, a cada dia que passa, testemunhamos a queda do cinema criado pelos irmãos Lumière.
Mas, no fundo, o que torna um filme bom? Ou melhor que outro? Será que pela divisão dos gêneros? Uma comédia precisar ser 100% comédia? Suspense tem de ser sempre suspense? Um filme não pode misturar gêneros? O Globo de Ouro divide suas categorias em drama e comédia, por exemplo. O fato é que os principais prêmios colocam seus selos de garantia em produções e separam atores principais de coadjuvantes, direção de roteiro, e aprendemos de forma errada o que é o bom cinema - por meio de números, efeitos visuais e prêmios.
Mas, afinal, o que é cinema? E o que é cinema de qualidade? Penso que ele deve romper gêneros e falar diretamente com a platéia. Não importa se é mudo ou falado. Ele deve emocionar o público, envolvê-lo, de alguma forma. Poucos conseguem isso e poucas são as obras-primas. WALL-E não precisa de diálogos para se comunicar com a platéia dos oito aos 80. A Pixar fez um longa de deixar os olhos do público brilhando com o avanço da tecnologia no cinema, mas ela quer mesmo é falar do verdadeiro significado da sétima arte, que se perdeu no tempo. WALL-E é uma história que se comunica 90% do tempo com imagem, som, ruído e música. Precisa de algo mais? Parece que não. Gênios como Charles Chaplin, Buster Keaton e Jacques Tati sabiam disso. Os mestres da Pixar também. WALL-E fala de futuro, mas quer é resgatar o passado.
A Pixar joga a trama em 2775, ou algo assim. A Terra virou um depósito de lixo do próprio homem, que se mandou para o espaço a bordo de uma gigantesca nave. No planeta, ficaram apenas robozinhos com a missão ingrata de limpar tudo para que a Humanidade possa, um dia, retornar. Pelos cálculos da trama, a Terra foi dominada pela sujeira total em torno de 2070. Ou seja, quando chegarmos ao ano de 2070 na vida real, WALL-E já será um filme antigo. E a trama criada por Andrew Stanton e Jim Capobianco só começa depois de 700 anos.
A Pixar joga a trama em 2775, ou algo assim. A Terra virou um depósito de lixo do próprio homem, que se mandou para o espaço a bordo de uma gigantesca nave. No planeta, ficaram apenas robozinhos com a missão ingrata de limpar tudo para que a Humanidade possa, um dia, retornar. Pelos cálculos da trama, a Terra foi dominada pela sujeira total em torno de 2070. Ou seja, quando chegarmos ao ano de 2070 na vida real, WALL-E já será um filme antigo. E a trama criada por Andrew Stanton e Jim Capobianco só começa depois de 700 anos.
É apenas uma observação inicial para classificar WALL-E como a melhor ficção científica da década. Mas é injusto prender o filme a apenas um gênero. Tem comédia também - e no melhor estilo do cinema mudo. Mas não podemos ficar só nisso. E, ao contrário do que muitos pensam, animação não é um gênero. Ou, pelo menos, não deveria ser. Lá pela metade de WALL-E, por exemplo, a Pixar faz questão de nos lembrar que estamos vendo uma animação e não um filme cheio de efeitos visuais.
Claramente, a Pixar está tentando dizer algo. O cinema evolui tecnicamente, mas a linguagem é a mesma. Eu captei da seguinte forma: cinema é linguagem. É uma forma de expressão. Não importam os gêneros. Não importa se é filme ou desenho. Não precisamos de palavras. Basta entender a linguagem universal que existe entre o amor, a esperança, a amizade e a arte.
Alguns acusarão WALL-E de hipocrisia, afinal a Pixar fala do excesso de consumo quando estamos numa indústria chamada Hollywood. Mas não é isso. Não é somente uma produção que carrega referências e mensagens ecológicas ou pacíficas. A verdade é que WALL-E tenta mostrar a uma nova geração o que os mestres dos primórdios da sétima arte tentaram nos ensinar. É aquela velha pergunta que volta de vez em quando em nossas mentes e corações: o que é cinema?
WALL-E (WALL-E, 2008)
Direção: Andrew Stanton
Roteiro: Andrew Stanton e Jim Capobianco
Com as vozes de Ben Burtt, Elissa Knight, Jeff Garlin, Fred Willard, John Ratzenberger e Sigourney Weaver
20 Comments:
Bah... tipo, bah!!! Muito bom o filme, sem muito o que falar, é 5 estrelas mesmo.
Abraços!
Só eu que achei apenas bom?
Tó de novo na ilha ...
ehehehe
Mas sabia que o povo iria adorar ...
Se essa for realmente a pretensão dos artistas da Pixar, então tomara que eles sigam levando-a a cabo. Pois é uma grande causa. Nota-se pelo seu tom que a coisa é séria. Nasceu um clássico?
Confesso que não sou grande fã de suas obras, mas RATATOUILLE e esse filme devem mesmo ser tudo isso que falam. Talvez o veja no cinema, mesmo dublado.
Otávio, é sensacional mesmo. Wall-E consegue ir mais longe do que Ratatouille, principalmente no uso básico do que é o cinema: registro de imagens em movimento, sem que nada precisse ser explicado. Suas referências a 2001 são explícitas, e o uso do som é executado com habilidade e maestria. O trabalho de Ben Burtt consegue ir além de Star Wars. Na verdade eu daria metade do prêmio(no caso de Wall-E ganhar como melhor animação) para ele. Mas com certeza ele será indicado e deve ganhar na categoria de efeitos sonoros. Você assistiu a versão legendada? Abs.
É por ler críticas como essa que minha expectativa para ver "Wall-E" já atingiu um nível inacreditável. Belíssimo texto, parabéns! Boa semana.
Ah, eu amei! Faltou dizer que o filme é muito romântico. Me emocionei, dei risada, adorei!
Bjs
Não disse que o Rato sairia do topo da sua lista? :p Tirou?
Abraço!
Barreto, voltando de Viagem ao Centro da Terra... onde a pergunta "o que é cinema?" se faz mais presente ainda. Precisamos falar a respeito.
Vi hoje e como disse a muitos via conversa por MSN, não sabia se ria, chorava, ou se olhava para o rosto deslumbrado de minha irmã de 6 anos. Sensacional esse filme! Sem palavras! Sem adjetivos, como você mesmo disso!
5 estrelas merecidíssimas
Ciao!
Que texto belíssimo! Pelo jeito, "Wall-E" é cinema! Ainda não conferi o filme, mas é por causa de textos como o seu que estou doida para conferir a animação!
Beijos e uma ótima semana!
Vou ver amanha, gostei do texto e mantenho altas expectativas sobre Wall-E.
Abraço!!!
Marcus, filmaço!
Johnny, o que seria do azul se todos gostassem do amarelo? É assim mesmo...
Gustavo, você não viu RATATOUILLE. Veja logo!
Denis, Oscars de Edição e Mixagem de Som no papo. Ou então, será roubado como foi o Oscar de Efeitos Visuais para A BÚSSOLA DE OURO.
Vinicius, obrigado! Espero que goste do filme como eu gostei.
Flavia, o filme é romântico também. Tem drama, comédia, ação. E também é ficção científica. E dizem que animação é um gênero...
Fabio, mas você gostou de VIAGEM AO CENTRO DA TERRA? Vale a pena? Ah, e WALL-E é o melhor da Pixar!
Wally, também saí sem palavras de... WALL-E.
Kamila, obrigado! Tomara que você goste do filme.
Pedro, obrigado! Vá sem medo. WALL-E é demais!
Abs! E boa semana a todos!
Cara, WALL-E é tudo isso mesmo! To besta até agora...
Como dissestes, é uma chacoalhada sobre o que é realmente cinema.
Pior que foi sobre isso que escrevi também quando falei dele no Pipoca. WALL-E vem com o verdadeiro significado do que é cinema.
Fantástico demais!
E muito boa sua análise toda!
Abs!!
É um 2001 romântico! Muito bom!
Victor, obrigado! Estou louco pra ver o filme de novo.
Antonio Carlos, seja bem-vindo! Vc tem blog?
Abs!
Otávio, estava lembrando passagens de Wall-E e o que mais ficou impregnado na minha cabeça foi aqueles espaços vazios num planeta Terra futuro e montes de lixo pragmaticamente e metodoticamente guardados pelo robô. Sendo assim, o que mais mexeu comigo no filme foi a solidão do robô e sua tentativa desesperada de contato humano. O filme me fez uma pergunta ainda mais alarmante que a sua: O que é a vida? Alguns de nós não nos escondemos em espaços vazios, incomunicáveis e receosos de amostras de afeto? Também não juntamos cacarecos inúteis querendo preencher um espaço que só é completamente preenchido por emoções fortes e verdadeiras? A questão chave é: o futuro dos seres humanos é a perda daquilo que é intrínseco a nós, a nossa humanidade? Não teremos mais tempo e vontade para apreciar coisas simples que fazem parte de nosso cotidiano e passam totalmente despercebidas? A verdade é que tenho muito medo da resposta, pois parece que musicais inocentes como Hello Dolly! não farão mais parte de nosso futuro, se é que já nem fazem parte mais...
A magnifíca parte de Ratatouille em que o crítico de cinema volta à sua infância num flashback também fala, em escala menor, dessa perda pelas coisas simples à medida que nos tornamos adultos demais...
Incrivelmente não estreou por aqui, mas esto numa ansiedade extraordinária... Pelo visto deve superar "Ratatouille", coisa que eu achava impossível. Parabéns pelo texto!
Denis, WALL-E abre caminhos para diversas interpretações. Isso é o bom cinema!
Weiner, não estreou? Lamentável. Espero que WALL-E chegue logo em sua cidade.
Abs!
Otávio, não tenho blog, sou apenas um leitor casual que estava pesquisando sobre filmes e topou com o seu blog. Aliás, parabéns, é um blog muito legal. O comentário desse Denis sobre Wall-E quase quebrou minha espinha dorsal! Muito inteligente! Até mais.
Olá Otávio! Transcrevo aqui meu comentário publicado no blog da Kamila e do Vinícius sobre ‘Wall-E’.
‘Wall-E’ tem o selo de qualidade da Pixar (tecnicamente é perfeito). Tem um personagem (o do título) magnífico e encantador. Mas merecia um roteiro melhor. Explico: Seu primeiro ato é genial. Uma explosão de criatividade. Sem diálogos e com uma atmosfera melancólica e poética. Mas infelizmente este encanto e clima se perde no seu segundo ato (que só cresce quando estão em cena apenas a dupla protagonista - o “balé” de Wall-E com o extintor é belíssimo), que privilegia a aventura e a “ação”. Sem falar que os personagens humanos e os robôs “coadjuvantes” não são tão inspirados quanto poderiam e deveriam ser. Isso não tira sua importância e ousadia (um desenho praticamente sem diálogos), mas a sensação que tive é que ‘Wall-E’ poderia de fato ter sido o desenho genial que todos (ou pelo menos a maioria) dizem ser.
Um grande abraço!
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