quarta-feira, dezembro 31, 2008

Rede de Mentiras

"Ei, Russell, nós ralamos pra chegar até aqui, cara...
Sabe que ainda tenho pesadelos com aquele filme que fizemos com a Sharon Stone?"



Rede de Mentiras (Body of Lies, 2008) tinha tudo para ser o filme norte-americano definitivo sobre o estudo da atual guerra contra o terrorismo. Talvez ainda mais que Syriana. Bom, era o que eu esperava. Mas a seriedade do longa de Ridley Scott está só na fachada.

Antes de criticar, acho que é preciso conhecer o cinema de Ridley Scott, diretor que veio da publicidade. Seus melhores filmes - é verdade - não negam a origem de seu talento inegável. Scott pode ser um diretor que, como poucos, sabe manipular som, luzes e cores para nos contar uma boa história, mas dizer que ele é formalista e mais preocupado com a estetização das imagens por ser publicitário, aí já parece falta de conhecimento de leigo metido a sabichão. Na verdade, qual é o problema de Ridley Scott ser um ótimo diretor de filmes que privilegiam o cinema-espetáculo? Para mim, nenhum. Não tenho esse preconceito. E Ridley Scott sabe fazer isso muito bem. Vide Os Duelistas, Alien, Blade Runner, Gladiador e Falcão Negro em Perigo - seus melhores filmes. Ao mesmo tempo, acho que seus longas (os bons e os "menos bons") oferecem um panorama fascinante sobre o presente e o futuro da Humanidade. Mas isso é coisa da minha cabeça. Eu costumo defender Ridley Scott. Gosto até do "massacrado" Um Bom Ano. Juro!

Agora, o que eu posso dizer se o próprio Ridley Scott quer mudar de um gênero para outro como uma criança tem dúvidas na hora de escolher seu presente de Natal? Não é tarefa fácil, mas respeito suas decisões como cineasta com a necessidade de desafiar seus próprios limites. Mas também penso que um bom diretor deveria ser autor não somente por sua linguagem. As imagens, os cenários, os lugares comuns também deveriam representar assinaturas. Para mim, Ridley Scott só deveria fazer ficção cinetífica e épicos grandiosos. O cara sabe olhar um desenho e enxergar movimento. Mas fazer o quê?

No início, Scott apresenta seu Rede de Mentiras como um filme extremamente sério sobre o combate ao terrorismo. Leonardo DiCaprio é Roger Ferris, um agente de campo da CIA, perseguindo um Osama bin Laden da vez no Oriente Médio. Russell Crowe é Ed Hoffman, seu senhor da guerra rodeado de tecnologias para assessorá-lo dentro do território do Tio Sam. O primeiro é impetuoso, idealista e, digamos, bonzinho até o último fio de cabelo. O segundo é frio, calculista e jamais se importaria com a segurança de seu agente se isso ameaçasse a paz dos EUA. O embate entre os dois poderia apresentar uma construção ou um desenvolvimento muito mais interessante, mas, de novo, eu digo: Fazer o quê? Ora, Ridley Scott não esconde sua origem publicitária e fica doido pra testar uma iluminação diferente aqui e outra ali. Doido para que a correria e a ação tomem conta da história. O agente interpretado por DiCaprio praticamente faz as mesmas coisas que James Bond - atira, foge de explosões e é salvo na hora H. Ah, e ainda tem tempo pra namorar... você sabe como funciona. Ou seja, não dá pra levar a sério.

Isso não seria problema se Scott assumisse sua tara por filmes gigantescos. É o que ele faz de melhor. Como análise do horror da guerra, que conta cadáveres de soldados para enriquecer governantes, Rede de Mentiras até poderia ser um complemento a Falcão Negro em Perigo, por exemplo. Mas Scott não decide se quer fazer espetáculo ou se quer ser didático. E como a ação vai e volta sem aviso prévio, o personagem mais legal do roteiro de William Monahan (Os Infiltrados), adaptado do livro de David Ignatius, jornalista do Wall Street Journal que cobriu as peripécias da CIA no Oriente Médio, também termina com um aproveitamento de time de segunda divisão. Falo de Hani (o ótimo Mark Strong), o chefe da inteligência da Jordânia, que oferece ajuda a Roger Ferris. É um personagem surpreendente, mas que é facilmente esquecido, já que o importante aqui é curtir a ação elaborada por Ridley Scott.

Entenda: Tecnicamente, o filme é perfeito. E os atores são ótimos. Mas se o diretor de Falcão Negro em Perigo e Gladiador queria mesmo era fazer espetáculo, ele deveria assumir essa intenção durante as duas longas e confusas horas de Rede de Mentiras. Ou ele deveria ser sério do início ao fim. Claro que, às vezes, dá pra encontrar um equilíbro. Mas Rede de Mentiras não é Fogo Contra Fogo ou O Resgate do Soldado Ryan. Fazer o quê?

Rede de Mentiras (Body of Lies, 2008)
Direção: Ridley Scott
Roteiro: William Monahan (Baseado no livro de David Ignatius)

Elenco: Leonardo DiCaprio, Russell Crowe, Mark Strong e Golshifteh Farahani

7 Comments:

At 10:39 AM, dezembro 31, 2008, Blogger Romeika said...

Nao tive muito interesse com relacao ao filme, tirando o fato de ser protagonizado pelos dois acima (nao sou grande admiradora do Ridley Scott, mas gostei de "Gladiador"). Adorei a legenda da foto hehehehe Feliz ano novo, Otavio!

 
At 2:40 PM, dezembro 31, 2008, Blogger Cecilia Barroso said...

É um filme mediano, mas senti a mesma falta de definição do diretor.

Daqueles que a gente pode ver sem esperar muita coisa...

Beijocas

 
At 3:53 PM, dezembro 31, 2008, Anonymous Anônimo said...

Particularmente sempre achei o Scott um diretor muito limitado, apesar de sempre convencer no aspecto técnico como você mesmo comentou. E geralmente não gosto desses filmes que dão uma de sério, mas são desculpas para explosões e cenas de ação.

Otavio, mandei um e-mail pra você (e também para o e-mail da SBBC), recebeu?

Um excelente 2009 para todos nós ;-)

 
At 4:35 PM, janeiro 01, 2009, Anonymous Anônimo said...

Eu gostei muito deste filme, Otavio. Colocaria "Rede de Mentiras" lado a lado com "Syriana - A Indústria do Petróleo" como um dos bons longas sobre a questão do Oriente Médio.

Beijos!

 
At 12:58 AM, janeiro 02, 2009, Blogger mari =) said...

ou, seu blog é muito legal !
eu estou começando o meu agora, será que pode dar uma ajudinha ?
http://ograndefilme.blogspot.com/

 
At 3:54 PM, janeiro 02, 2009, Blogger Alex Gonçalves said...

Otavio, gosto de Ridley Scott, mas detesto os seus filmes espetáculos como "Gladiador", "Falcão Negro em Perigo" e "Cruzada". Acho que é um diretor que tem muita personalidade quando apresenta tramas mais simples, porém bem inteligentes ("Os Vigaristas"), longas não muito ambiciosos e que se tornam grandes longas cultuados ("Alien") ou mesmo quando entra em terrenos perigosos, como a sequência de "O Silêncio dos Inocentes". Não acho de forma alguma que Scott deva limitar o seu cinema dentro de gêneros como épicos e ficção, pois é justamente nestes onde coisas mirabolantes acontecem até cansar. Mas este "Rede de Mentiras" eu não vejo nem a pau! Leonardo DiCaprio e Russell Crowe são, na minha modesta opinião, um dos piores atores da atualidade. E se "Rápida e Mortal" é um pesadelo (ainda que eu goste do faroeste) este novo de Scott não deve nem dar vontade de ir dormir de tão pavoroso que deve ser.

 
At 3:43 AM, janeiro 11, 2009, Anonymous Anônimo said...

Concordo com muita coisa aí sobre o filme. Apesar de ter gostado, o tema já ta batido e parece cair na onda de "O Reino" em misturar ação e cérebro. A parte técnica é mesmo perfeita, os atores estão excelentes e o filme tem grandes momentos. Mas o resultado é sim limitado, infelizmente.

Ciao!

 

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