Frost/Nixon
Ron Howard é um dos nomes mais queridos de Hollywood. Já trabalhava como ator quando usava fraldas. Cresceu no cinema - em filmes famosos como Loucuras de Verão, de George Lucas -, e principalmente na TV, onde marcou época no programa The Andy Griffith Show e na série Happy Days, além de ilustres participações em outros shows como Daniel Boone, Lassie, Bonanza, M.A.S.H. e Terra de Gigantes. Mas foi como diretor que Ron Howard conquistaria seu espaço definitivo. Nesta nova função, soube como poucos agradar público e estúdios alternando produções 100% comerciais, como Splash - Uma Sereia em Minha Vida (1984), Cocoon (1985), Willow - Na Terra da Magia (1989), O Grinch (2000), O Código Da Vinci (2006), e obras 50% sérias/50% divertidas, como O Jornal (1994), Apollo 13 (1995), e Uma Mente Brilhante (2001), que lhe rendeu os Oscars de Filme e Direção.
O padrão ideal de cineasta para a indústria, no entanto, dificilmente toparia fazer algo tão "adulto" como Frost/Nixon (2008). E não é que Ron Howard provou, mais uma vez, que sabe o que faz? Este é, de longe, seu trabalho mais maduro. Mas, curiosamente, jamais deixa de ser um típico filme de Ron Howard. Para o bem ou para o mal. Alguns detratores podem dizer que a famosa entrevista dada pelo ex-presidente americano Richard Nixon (Frank Langella, estupendo) ao apresentador de TV britânico David Frost (Michael Sheen, transbordando carisma) é somente mais uma desculpa para o diretor usar e abusar do tema da "volta por cima" ou "do desastre ao triunfo", como dizia o subtítulo nacional infame de Apollo 13. Nada mais americano, certo? Mas outros defenderão, como eu, e dirão que Frost/Nixon, além de ser tudo isso, também é o filme popularmente chamado de "parado" mais ágil e empolgante da história do cinema.
Só que para ver Frost/Nixon desta forma é preciso reconhecer o talento de Ron Howard como diretor contador de histórias. E saber o que ele já fez pelo cinema. Ele é a prova de que um filme pode ser exemplo de "arte", mas também pode ser "comercial". Para começar, analise a trama de Frost/Nixon, assinada por Peter Morgan (A Rainha, O Último Rei da Escócia), baseada numa peça premiada de sua própria autoria e estrelada pelos mesmos Michael Sheen e Frank Langella. Na abertura, relembramos por imagens de arquivo como Richard Nixon renunciou ao cargo de presidente dos EUA. Depois disso, somos apresentados aos opostos Frost e Nixon. Exilado em um programa de TV na Austrália, o inglês bonzinho anda meio por baixo e vê a tentativa de entrevistar o ex-presidente ianque como a oportunidade perfeita de dar a volta por cima. Além disso, defende que essa pode ser a grande chance para o vilão admitir sua culpa no escândalo do Watergate e pedir desculpas ao povo americano. Nixon, por sua vez, só aceita dar a entrevista em troca de uma boa grana e por considerar Frost um adversário de segunda categoria. Mais tarde, vemos a preparação para a entrevista e, finalmente, Frost e Nixon se enfrentando em vários rounds. Pelo roteiro, seria o filme ideal para ser aproveitado por professores de história em sua aulas ou uma trama para ser contada apenas no teatro. Mas Ron Howard jamais esquece a linguagem cinematográfica e seu público, afinal isso não é um documentário. Muito menos uma peça filmada.
E eu disse rounds porque a entrevista de Richard Nixon a David Frost parece uma luta feroz de boxe. Adoro quando a câmera para de rodar e vemos Nixon sendo assessorado por seu lacaio Jack Brennan (Kevin Bacon), assim como Frost por sua equipe formada por James Reston Jr. (Sam Rockwell), Bob Zelnick (Oliver Platt) e John Birt (Matthew Macfadyen). Parecem lutadores profissionais exaustos, suados e feridos nos cantos opostos do ringue, sendo aconselhados por seus treinadores antes de retornarem ao centro da lona para mais um round.
Dobrar o astuto Richard Nixon não será nada fácil para o tranqüilo David Frost, que não faria mal a uma mosca. Sua equipe não agüenta ver o chefe bonzinho sendo destroçado no ringue pelo adversário sem oferecer qualquer resistência e ameaça abandoná-lo em sua humilhação. Mas há uma cena chave, que envolve um telefonema de Richard Nixon a David Frost na calada da noite. É uma cena que revela a admiração antes implícita do abandonado Nixon pelo carismático e celebrado Frost. É uma cena que demonstra o grau de comprometimento e monstruosidade dos atores Frank Langella e Michael Sheen. É uma cena que define os minutos finais de Frost/Nixon e que mostra a força do diretor Ron Howard na hora de seduzir seu público. Mesmo em um filme tão sério.
Gosto de pensar, inclusive, que Ron Howard e Peter Morgan levaram Frost/Nixon ao cinema para quebrar mitos e revelar seres humanos de carne e osso. Após a renúncia, Nixon foi perdoado pelo presidente seguinte, Gerald Ford. Com isso, o crápula não teve o julgamento que deveria ter enfrentado. A entrevista para David Frost veio para reparar tal erro. E ela ganha os cinemas, uma mídia de alcance gigantesco, também para relembrar os anos infernais governados por George W. Bush. Pois então imagine o antecessor de Barack Obama no lugar do personagem de Frank Langella encarando Michael Sheen. Assim, vejo Frost/Nixon como um filme sobre símbolos, máscaras e metáforas desconstruídas por palavras e atitudes diretas.
Fique atento em como Nixon julga seu oponente pelo sapato que ele usa. O sapato é um símbolo que define a admiração entre os opostos Frost/Nixon. Mostra como o filme engana pela aparência e como devia ser visto e revisto por diversos públicos. Seja por estudantes de jornalismo - está entre os melhores do "gênero" ao lado de A Montanha dos Sete Abutres (1951), de Billy Wilder, Todos os Homens do Presidente (1976), de Alan J. Pakula, O Informante (1999), de Michael Mann, e Boa Noite e Boa Sorte (2005), de George Clooney -, ou por professores e alunos de todas as matérias e idades que buscam o conhecimento e a verdade, assim como cinéfilos, que buscam todos os tipos de cinema. Seja o de arte ou seja o de entretenimento. Poucos sabem fazer um espetáculo deste porte. E Ron Howard é um deles.
Frost/Nixon (Frost/Nixon, 2008)
Direção: Ron Howard
Roteiro: Peter Morgan (Baseado em sua própria peça)
Elenco: Michael Sheen, Frank Langella, Sam Rockwell, Oliver Platt, Kevin Bacon, Matthew Macfadyen e Rebecca Hall
O padrão ideal de cineasta para a indústria, no entanto, dificilmente toparia fazer algo tão "adulto" como Frost/Nixon (2008). E não é que Ron Howard provou, mais uma vez, que sabe o que faz? Este é, de longe, seu trabalho mais maduro. Mas, curiosamente, jamais deixa de ser um típico filme de Ron Howard. Para o bem ou para o mal. Alguns detratores podem dizer que a famosa entrevista dada pelo ex-presidente americano Richard Nixon (Frank Langella, estupendo) ao apresentador de TV britânico David Frost (Michael Sheen, transbordando carisma) é somente mais uma desculpa para o diretor usar e abusar do tema da "volta por cima" ou "do desastre ao triunfo", como dizia o subtítulo nacional infame de Apollo 13. Nada mais americano, certo? Mas outros defenderão, como eu, e dirão que Frost/Nixon, além de ser tudo isso, também é o filme popularmente chamado de "parado" mais ágil e empolgante da história do cinema.
Só que para ver Frost/Nixon desta forma é preciso reconhecer o talento de Ron Howard como diretor contador de histórias. E saber o que ele já fez pelo cinema. Ele é a prova de que um filme pode ser exemplo de "arte", mas também pode ser "comercial". Para começar, analise a trama de Frost/Nixon, assinada por Peter Morgan (A Rainha, O Último Rei da Escócia), baseada numa peça premiada de sua própria autoria e estrelada pelos mesmos Michael Sheen e Frank Langella. Na abertura, relembramos por imagens de arquivo como Richard Nixon renunciou ao cargo de presidente dos EUA. Depois disso, somos apresentados aos opostos Frost e Nixon. Exilado em um programa de TV na Austrália, o inglês bonzinho anda meio por baixo e vê a tentativa de entrevistar o ex-presidente ianque como a oportunidade perfeita de dar a volta por cima. Além disso, defende que essa pode ser a grande chance para o vilão admitir sua culpa no escândalo do Watergate e pedir desculpas ao povo americano. Nixon, por sua vez, só aceita dar a entrevista em troca de uma boa grana e por considerar Frost um adversário de segunda categoria. Mais tarde, vemos a preparação para a entrevista e, finalmente, Frost e Nixon se enfrentando em vários rounds. Pelo roteiro, seria o filme ideal para ser aproveitado por professores de história em sua aulas ou uma trama para ser contada apenas no teatro. Mas Ron Howard jamais esquece a linguagem cinematográfica e seu público, afinal isso não é um documentário. Muito menos uma peça filmada.
E eu disse rounds porque a entrevista de Richard Nixon a David Frost parece uma luta feroz de boxe. Adoro quando a câmera para de rodar e vemos Nixon sendo assessorado por seu lacaio Jack Brennan (Kevin Bacon), assim como Frost por sua equipe formada por James Reston Jr. (Sam Rockwell), Bob Zelnick (Oliver Platt) e John Birt (Matthew Macfadyen). Parecem lutadores profissionais exaustos, suados e feridos nos cantos opostos do ringue, sendo aconselhados por seus treinadores antes de retornarem ao centro da lona para mais um round.
Dobrar o astuto Richard Nixon não será nada fácil para o tranqüilo David Frost, que não faria mal a uma mosca. Sua equipe não agüenta ver o chefe bonzinho sendo destroçado no ringue pelo adversário sem oferecer qualquer resistência e ameaça abandoná-lo em sua humilhação. Mas há uma cena chave, que envolve um telefonema de Richard Nixon a David Frost na calada da noite. É uma cena que revela a admiração antes implícita do abandonado Nixon pelo carismático e celebrado Frost. É uma cena que demonstra o grau de comprometimento e monstruosidade dos atores Frank Langella e Michael Sheen. É uma cena que define os minutos finais de Frost/Nixon e que mostra a força do diretor Ron Howard na hora de seduzir seu público. Mesmo em um filme tão sério.
Gosto de pensar, inclusive, que Ron Howard e Peter Morgan levaram Frost/Nixon ao cinema para quebrar mitos e revelar seres humanos de carne e osso. Após a renúncia, Nixon foi perdoado pelo presidente seguinte, Gerald Ford. Com isso, o crápula não teve o julgamento que deveria ter enfrentado. A entrevista para David Frost veio para reparar tal erro. E ela ganha os cinemas, uma mídia de alcance gigantesco, também para relembrar os anos infernais governados por George W. Bush. Pois então imagine o antecessor de Barack Obama no lugar do personagem de Frank Langella encarando Michael Sheen. Assim, vejo Frost/Nixon como um filme sobre símbolos, máscaras e metáforas desconstruídas por palavras e atitudes diretas.
Fique atento em como Nixon julga seu oponente pelo sapato que ele usa. O sapato é um símbolo que define a admiração entre os opostos Frost/Nixon. Mostra como o filme engana pela aparência e como devia ser visto e revisto por diversos públicos. Seja por estudantes de jornalismo - está entre os melhores do "gênero" ao lado de A Montanha dos Sete Abutres (1951), de Billy Wilder, Todos os Homens do Presidente (1976), de Alan J. Pakula, O Informante (1999), de Michael Mann, e Boa Noite e Boa Sorte (2005), de George Clooney -, ou por professores e alunos de todas as matérias e idades que buscam o conhecimento e a verdade, assim como cinéfilos, que buscam todos os tipos de cinema. Seja o de arte ou seja o de entretenimento. Poucos sabem fazer um espetáculo deste porte. E Ron Howard é um deles.
Frost/Nixon (Frost/Nixon, 2008)
Direção: Ron Howard
Roteiro: Peter Morgan (Baseado em sua própria peça)
Elenco: Michael Sheen, Frank Langella, Sam Rockwell, Oliver Platt, Kevin Bacon, Matthew Macfadyen e Rebecca Hall
7 Comments:
Embates entre atores é um dos elementos que mais admiro em filmes. Dos últimos, amei Blanchett e Dench indo pau a pau em "Notas Sobre um Escândalo" e os brilhantes Law e Caine no devastador duelo de "Um Jogo de Vida ou Morte".
Por isso, não vejo a hora de conferir este filme!
Ciao!
Estou ansioso para conferir "Frost/Nixon", o que devo fazer o mais urgente possível. A presença dos atores Langella e Sheen me deixa animado(desde "A Rainha" eu admiro muito o trabalho do Sheen).
O Howard teve seus escorregões ao longo da carreira, mas acho todos perdoáveis. Eu o admiro muito enquanto diretor, acho sim que ele tem coragem de abraçar projetos dos mais variados níveis, sem deixar que tudo se transforme em algo ruim.
O Morgan então, nem se fala. Um roteirista e tanto, provado pelas passagens que você mesmo citou no texto.
E por fim, a respeito do Michael Sheen, acho que foi esse carisma todo que conquistou a Kate Beckinsale. Você sabe, né, que eles têm uma filha? Pois bem, para conquistar uma mulher tão linda como ela o cara tem que ter um carisma e tanto...
Abraços!
Nunca esperava um trabalho desse porte de Ron Howard, acabei quebrando a cara, e vendo um dos melhores filmes do ano!
Wally, ótimas lembranças! É uma briga de cachorro grande em FROST/NIXON. Abs!
Weiner, eu juro que não sabia do Michael Sheen e da Kate Beckinsale... Ela não é mulher do Len Wiseman? Ou não é mais? De qualquer forma, eu não sabia... E ela é linda mesmo! Abs!
Pois é, Cleber! E eu gosto muito do Ron Howard, mas jamais achei que ele seria capaz de fazer um filme assim. Abs!
Otávio, ela está separada do Sheen desde 2000. Quando ela filmou "Anjos da Noite" (o primeiro) ela iniciou seu romance com o Wiseman, do qual se não me engano ele é diretor.
A filha dos dois se chama Lily Sheen e nasceu em 1999.
Um abraço!
Acho que esse é o filme mais inteligente da temporada. Dessa maneira, nem vejo tanto o Ron Howard como o maior responsável por seu sucesso (ainda que seja seu trabalho), mas especialmente o material original (roteiro é fantástico, sem falar das atuações principais). De qualquer maneira, é um excelente filme e Hoaward merece algum crédito sim :-)
Não sei se é o trabalho mais maduro dele, mas é uma grande prova do talento do Howard, um representante do estilão de cinema hollywoodiano.
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