Sinédoque, Nova Iorque
Charlie Kaufman talvez seja o roteirista americano mais celebrado da década. Para ele, não há nada mais bizarro que a mente humana, que se equilibra numa linha tênue separando a realidade da fantasia. Porém, sua visão complexa sempre foi traduzida para o público de forma ora poética, ora insana por cineastas talentosos como Spike Jonze (Quero Ser John Malkovich, Adaptação) e Michel Gondry (Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças), que, justamente por isso, fizeram filmes magníficos. Mas em sua estreia na direção, Kaufman extrapolou os limites de sua própria imaginação, o que torna compreensível que ele (e somente ele) entenda Sinédoque, Nova Iorque (Synecdoche, New York, 2008). Nem Jonze, nem Gondry, nem ninguém poderia assumir a direção deste roteiro.
E admitir que Sinédoque, Nova Iorque não foi feito para ser compreendido jamais pode ser considerado um problema. Trata-se de um filme que motiva sensações distintas ao ser encarado como uma experiência rara. É o sonho de um sonho de uma peça. É o lirismo da vida real. Seria como sonhar com um filme de Fellini num quarto de frente para a estressante Times Square. Especialmente Oito e Meio. Mas Kaufman, nem ninguém, consegue ser Fellini.
Por mais que seja fascinante, Sinédoque, Nova Iorque, ao mesmo tempo, mostra que não estamos diante de um gênio. E que Kaufman está acenando para a plateia com a intenção de ser reconhecido como tal. O fato é que nenhum cineasta vivo seria capaz de fazer este filme exatamente como Kaufman o imaginou. Talvez se sonho semelhante tivesse saído da mente de um David Lynch antes de um porre ou baseado. Talvez.
Sem dúvida que estamos diante de um autor. Mas diferente de grandes visionários que já viveram para contar histórias maravilhosas e imortais, Kaufman se leva a sério demais. Sinédoque, Nova Iorque está aí para forçar a barra e fazer cinéfilos carentes apontarem para o diretor/roteirista e concordarem com a estampa de sua camiseta, que diz em letras garrafais: "Gente, eu sou um gênio. Vocês estão comigo?"
Enquanto Michel Gondry e Spike Jonze entendiam os roteiros de Kaufman como viagens para se discutir a arte e a vida com base na cultura cinematográfica, o Kaufman diretor expõe uma falha ao não conseguir sustentar uma discussão a respeito de cinema, vida e arte em geral. Ele quer apenas analisar a própria arte, que sai de sua mente sem lembranças.
Mas Sinédoque, Nova Iorque tem Philip Seymour Hoffman, que é um ator fantástico. Ele vale o ingresso fazendo o neurótico diretor de teatro Caden Cotard, que planeja sua obra-prima. Dentro de um galpão, ele reconstrói a Big Apple para atingir a perfeição em sua peça. Sem que perceba, ele é desconstruído pela vida e encontra refúgio na arte. Vivendo da própria imaginação, Caden busca inconscientemente se completar como ser humano. Sua peça se confunde com sua vida entre momentos de fantasia e realidade.
Trocando o teatro pelo cinema, o problema de Sinédoque, Nova Iorque é fazer o cinéfilo lembrar de Marcello Mastroianni em Oito e Meio. Ou Kaufman seguiu essa linha ou é um alienado na história do cinema. De vez em quando, isso também é Hollywood. Esse brilho eterno de uma mente sem lembranças que tenta enganar uma nova geração ao mostrar que foi a fonte de todas as grandes ideias da sétima arte. Infelizmente, cada geração tem o gênio e a obra-prima que merece.
Sinédoque, Nova Iorque (Synecdoche, New York, 2008)
Direção e roteiro: Charlie Kaufman
Elenco: Philip Seymour Hoffman, Samantha Morton, Michelle Williams, Catherine Keener, Emily Watson e Dianne Wiest
E admitir que Sinédoque, Nova Iorque não foi feito para ser compreendido jamais pode ser considerado um problema. Trata-se de um filme que motiva sensações distintas ao ser encarado como uma experiência rara. É o sonho de um sonho de uma peça. É o lirismo da vida real. Seria como sonhar com um filme de Fellini num quarto de frente para a estressante Times Square. Especialmente Oito e Meio. Mas Kaufman, nem ninguém, consegue ser Fellini.
Por mais que seja fascinante, Sinédoque, Nova Iorque, ao mesmo tempo, mostra que não estamos diante de um gênio. E que Kaufman está acenando para a plateia com a intenção de ser reconhecido como tal. O fato é que nenhum cineasta vivo seria capaz de fazer este filme exatamente como Kaufman o imaginou. Talvez se sonho semelhante tivesse saído da mente de um David Lynch antes de um porre ou baseado. Talvez.
Sem dúvida que estamos diante de um autor. Mas diferente de grandes visionários que já viveram para contar histórias maravilhosas e imortais, Kaufman se leva a sério demais. Sinédoque, Nova Iorque está aí para forçar a barra e fazer cinéfilos carentes apontarem para o diretor/roteirista e concordarem com a estampa de sua camiseta, que diz em letras garrafais: "Gente, eu sou um gênio. Vocês estão comigo?"
Enquanto Michel Gondry e Spike Jonze entendiam os roteiros de Kaufman como viagens para se discutir a arte e a vida com base na cultura cinematográfica, o Kaufman diretor expõe uma falha ao não conseguir sustentar uma discussão a respeito de cinema, vida e arte em geral. Ele quer apenas analisar a própria arte, que sai de sua mente sem lembranças.
Mas Sinédoque, Nova Iorque tem Philip Seymour Hoffman, que é um ator fantástico. Ele vale o ingresso fazendo o neurótico diretor de teatro Caden Cotard, que planeja sua obra-prima. Dentro de um galpão, ele reconstrói a Big Apple para atingir a perfeição em sua peça. Sem que perceba, ele é desconstruído pela vida e encontra refúgio na arte. Vivendo da própria imaginação, Caden busca inconscientemente se completar como ser humano. Sua peça se confunde com sua vida entre momentos de fantasia e realidade.
Trocando o teatro pelo cinema, o problema de Sinédoque, Nova Iorque é fazer o cinéfilo lembrar de Marcello Mastroianni em Oito e Meio. Ou Kaufman seguiu essa linha ou é um alienado na história do cinema. De vez em quando, isso também é Hollywood. Esse brilho eterno de uma mente sem lembranças que tenta enganar uma nova geração ao mostrar que foi a fonte de todas as grandes ideias da sétima arte. Infelizmente, cada geração tem o gênio e a obra-prima que merece.
Sinédoque, Nova Iorque (Synecdoche, New York, 2008)
Direção e roteiro: Charlie Kaufman
Elenco: Philip Seymour Hoffman, Samantha Morton, Michelle Williams, Catherine Keener, Emily Watson e Dianne Wiest
10 Comments:
Bem, até agora tenho dúvidas quanto a genialidade de Charlie Kaufman, que me entorpeceu. Quero Ser John Malkovich e Brilho Eterno são dois dos filmes mais originais e mágicos que já vi, sendo este último meu romance preferido...choro horrores.
Enfim, estou curioso pela sua estréia na direção...ainda que a aprovação aqui não seja tão boa.
Ciao!
correção: NÃO tenho dúvidas. ;)
É, Wally! "Quero Ser John Malkovich", "Adaptação" e "Brilho Eterno..." são magníficos. Mas nem todo mundo pode ser diretor de cinema...
Só porque o McG pega numa câmera, todo mundo pensa que pode.
Abs!
Gente, eu não gosto de "Adaptação"!
Mas, vi "Sinédoque Nova Iorque", e como todos os filmes do Kauffman, é preciso ver uma, duas, três vezes até chegar num patamar de aceitabilidade cerebral.
Mas... admito! Ele é um dos poucos seres hollywoodianos que sofrem de excesso de criatividade, enquanto os outros vivem a era "nada se cria, tudo se copia".
Abraço, Otávio!
Sinceramente espero gostar do filme bem mais do que você. Kaufman ainda não me decepcionou, mas muitos comentam que "Sinédoque" é um tanto cansativo. Veremos...
Um ótimo texto, Otavio. Me deixou com muito mais vontade de assistir a este filme, até porque eu aprecio experiências raras no cinema. Necessitamos disso, ainda mais nesta época de remakes...
Beijos!
claro que original e criativo, afinal eh o Kaufman, mas confesso que fiquei meio perdido e com certeza não consegui absorver tudo o que ele quis passar.
mas eh um filme acima da média que merece (e exige) mais uma assistida, no mínimo!
Revi esse filme ainda hoje (tinha visto ano passado e achado difícil chegar a uma opinião). É um filme difícil e por vezes enfadonho demais. Mas conseguiu me emocionar, me "fazer sentir", especialmente na meia hora final. E ainda tem Philip Seymour Hoffman arrasando e confirmando que é um dos melhores atores americanos em atividade. Abraço!
Mas, amigos, não esqueçam: Criatividade não é sinônimo de qualidade! Ser diferente também não é garantia de qualidade.
Porém, o filme é obrigatório para cinéfilos. Gostem ou não de Kaufman como diretor. E a discussão tá boa e vale a pena.
Abs a todos!
Esse filme não estreou por essas bandas nordestinas, uma pena, tava doido para ver!
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