quinta-feira, março 12, 2009

Watchmen


O hype de Watchmen, filme e graphic novel, gera a inevitável expectativa de uma opinião inteligente, acima dos padrões da mente humana comum que acorda, toma café da manhã, vai trabalhar, volta para casa e tem pouco tempo para a família porque precisa dormir para enfrentar mais um dia de trabalho. Portanto, peço desculpas aos fãs, o público-alvo do filme de Zack Snyder, mas minha opinião é simples. Com todo o respeito ao original de Alan Moore e Dave Gibbons, Watchmen (2009), o filme, não é flor que se cheire porque cinema não é quadrinho. A sétima arte e a nona arte possuem linguagens diferentes e Zack Snyder não sabe disso. Ou, talvez, não esteja nem aí pra isso. Mas ser fiel a adaptação, com o aval do estúdio, aí até eu, amigo. Agora, trabalhar linguagens distintas com competência, isso sim, não é para qualquer um. Nem para mim, nem para Zack Snyder.

Não vou comentar a trama aqui para não estragar a surpresa de quem não leu, mas preciso apontar exageros e erros que citam levemente a história: Os primeiros minutos que antecedem os créditos e a bela abertura ao som de The Times They are A-Changin', classicaço de Mr. Bob Dylan, por motivos óbvios, já ilustra todo o cenário político e social da realidade alternativa de Watchmen.

Mais alguns minutinhos depois, sabemos exatamente como é o perfil de cada um dos "heróis". Enfim, não precisava de duas horas de absolutamente nada acontecendo na tela até os 30, 40 minutos finais. Esse ritmo pode funcionar nos quadrinhos, mas em um filme sobre vigilantes mascarados, Deus, só dá tééééédio. Soooooono. Mas fazer o quê? Essa é a visão de Zack Snyder. Ele acha que cinema também é xerocar cada quadrinho de uma graphic novel na tela, com uma ou outra mudança.

Watchmen é um filme muito longo sem necessidade. O que realmente vale a pena na trama daria um excelente filme de 1h30, porque o material de Alan Moore e Dave Gibbons é riquíssimo em criatividade, narrativa e ousadia. Mas Snyder, sob a mira dos fãs, colou na prova para manter a fidelidade. O resultado é um filme esburacado e descosturado, parecendo em diversos momentos uma ego trip sem sentido para quem não leu Watchmen.

Outro problema é a abordagem séria demais para 2h45 com um homem azul com pinto de fora na tela. Gente, Snyder faz questão de mostrar o treco balançando pra lá e pra cá. Ele raramente filma o Dr. Manhattan (Billy Crudup) da cintura pra cima, mesmo que já tenhamos visto o Johnson dele. E mais: Figurinos extravagantes, violência e movimentos a la Matrix nas raras cenas de ação dão o tom de uma produção que flerta com o fantástico, certo? Não para Zack Snyder. O diretor de 300 e Madrugada dos Mortos quer o público levando tudo a sério. Cara, isso já é demais pra mim. Mesmo que eu tenha crescido lendo quadrinhos.

Se é para abdicar de qualquer traço de infantilidade e cair na real, acho melhor o exemplo de Christopher Nolan em O Cavaleiro das Trevas. Puro cinema fantasioso, mas tratado com alma de policial dos anos 70 e com os dois pés no chão explicando cada detalhe sobre o universo do Homem-Morcego. Ninguém caiu de pára-quedas na Gotham City de Christopher Nolan. Tudo foi devidamente explicado. Já Watchmen não é para aqueles que não leram a obra de Moore e Gibbons. Diferente de Nolan, Snyder não é autor. Ele é fã, nerd e sabe tudo de quadrinhos. É como pegar um fanático por Star Wars nessas reuniões de gente fantasiada e colocá-lo para estudar o básico de cinema, deixando-o pronto para dirigir mais um episódio da saga criada por George Lucas. Ou seja, sairia um filme que os fãs sempre pediram a Deus. Mas dificilmente faria sentido para o restante do público.

Em Watchmen, não há nada errado com o clima fúnebre sobre o fim do heroísmo numa América que reescreve, de forma fictícia, sua história após a Guerra do Vietnã. O duro é engolir a falta de humor de Snyder, que quer nos convencer de que sua brincadeira é definitiva sobre a crise da nossa civilização. Respeito a obra original, mas acho que Snyder deve considerar Watchmen como literatura fundamental. Certo... Ok.

O filme não erra ao ser violento ou polêmico em sua conclusão que levaria Hitler e o Capitão Nascimento, de Tropa de Elite, às lágrimas. Não vou comentar isso. Vocês também perceberam que não estou analisando o perfil de cada um dos personagens. Nem o que há de criativo na história original. Deixo isso para os fãs. Estou falando de cinema, OK? Esse é o meu papel aqui. O que me leva a mais um problema: Até entendo que o Dr. Manhattan fale com jeito de HAL-9000, mas não há explicação para a atuação "cara de porta de madeira" dos outros atores, com exceção de Jeffrey Dean Morgan, que interpreta o Comediante, e Jackie Earle Haley, um grande ator num grande papel. Seu mascarado Rorschach é, de longe, ao lado da trilha sonora, a melhor coisa do filme. Com ou sem máscara, Haley torna seu personagem o mais fascinante e de fácil identificação com a platéia. Sua intenção, por isso mesmo, está à anos-luz do restante do elenco, assim como Zack Snyder.

Por tudo isso, não consigo levar a sério o hype em torno do filme. Para você ter uma ideia, tem gente dizendo que é o "Blade Runner de nosso tempo", pois não será compreendido agora, mas terá o devido reconhecimento em alguns anos. Ora, faça-me o favor. Blade Runner saiu de um conto e Ridley Scott criou toda uma atmosfera, que é estudada até hoje. Watchmen saiu de uma HQ e foi para o cinema sem um pingo de personalidade de seu diretor. É preferível comprar a edição encadernada e ler tudo de uma vez só. Aposto que será uma experiência superior ao filme de Zack Snyder. Você quer estudar Alan Moore e Dave Gibbons? Ok. Até entendo. Mas quem vai estudar um diretor que coloca Hallelujah, de Leonard Cohen, como trilha de uma cena de sexo?

Admito que gosto de algumas coisas no filme. Como a destruição mais bacana de uma metrópole que já vi no cinema, além do Rorschach, assim como o visual e as músicas escolhidas a dedo. Mas são detalhes que me impressionam graças a minha fome eterna por conteúdo nerd. Mesmo assim, preciso deixar a empolgação de lado e concordar com Alan Moore: Watchmen não funciona no cinema.

Watchmen (2009)
Direção: Zack Snyder
Roteiro: Alex Tse e David Hayter (Baseado na graphic novel de Alan Moore e Dave Gibbons)
Elenco: Jackie Earle Haley, Patrick Wilson, Billy Crudup, Jeffrey Dean Morgan, Malin Akerman, Matthew Goode e Carla Gugino

14 Comments:

At 11:50 PM, março 12, 2009, Anonymous Anônimo said...

"É preferível comprar a edição encadernada e ler tudo de uma vez só". Hehe, essa foi engraçada. Vou conferir essa "obra-prima" hoje. E não te falei que o jogo treino era fácil? 5 a 0 sem esforço e, principalmente, "sem soberba". Abs!

 
At 12:01 AM, março 13, 2009, Anonymous Anônimo said...

Otávio, só não concordo com a parte "a inevitável expectativa de uma opinião inteligente, acima dos padrões da mente humana", pois sua opinião é bem argumentada e portanto, inteligente! Você deixou claro que achou o filme mais ou menos e fez isso muito bem. Abs!

 
At 11:58 AM, março 13, 2009, Blogger Museu do Cinema said...

Tô por fora de Watchmen, mas pelo marketing e divulgação que estão fazendo merecia coisa melhor!

 
At 12:11 PM, março 13, 2009, Blogger gustavo said...

A Isabela Boscov tem uma idéia parecida com a sua tb...
Não sei.
Acho que vou esperar o dvd do filme.
Esse tipo de filme não é meu forte.
E tá hypado pro meu gosto.

 
At 2:03 PM, março 13, 2009, Anonymous Anônimo said...

Acho que desde já esse é o filme que mais dividiu as opiniões nesse ano. Ainda espero me surpreender, mas já tô achando complicado...

 
At 8:28 PM, março 13, 2009, Anonymous Anônimo said...

Eu também não gostei desse filme. Concordo que ele se estende demais. A trama é até interessante, mas o diretor peca por querer mostrar tudo ao mesmo tempo.... Existem situações ali que foram forçadas e outras que poderiam muito bem ser exploradas em futuras continuações.

Beijos e bom final de semana!

 
At 10:14 PM, março 13, 2009, Anonymous Anônimo said...

Otávio, pequena correção da minha parte: aquela fala no começo de Civil War está em Cool Hand Luke e não em The Hud. Abs!

 
At 12:49 PM, março 14, 2009, Blogger Gustavo H.R. said...

300 já era o cúmulo da pretensão estilística e da "solenidade" autoconsciente. Ou não, agora que estreou WATCHMEN? Quero muito gostar, mas sua crítica adiante os maiores temores.

Cumps.

 
At 1:19 AM, março 15, 2009, Blogger Unknown said...

Sabe, assisti ao filme e não me enfadei com sua lerdeza ou mesmo duração. Acho que funcionou bem para mim como um passatempo, porque conseguiu me distrair de verdade. Mas fiquei pensando um pouco a respeito e cheguei à conclusão de que estava num dia ótimo, com a cabeça fresca e livre de preguiça, enfim, disposto mesmo a assistir algo do tipo.
Nos meus dias normais não teria sido tão bonzinho ao avaliá-lo.
Acabei dando um 7,0.
Abraços, Otávio!!!!

 
At 2:21 PM, março 15, 2009, Blogger Robson Saldanha said...

Adoro filmes que são tão divididos assim pela crítica, uns exaltam outros rebaixam, quero ver muito!

 
At 5:53 PM, março 15, 2009, Anonymous Anônimo said...

Ante-Cinema: O site sobre cinema!

Visite-nos em www.ante-cinema.com

 
At 2:45 PM, março 16, 2009, Blogger Jonathan Rodrigues said...

"""""O que realmente vale a pena na trama daria um excelente filme de 1h30"""""


discordo completamente

o filme foi é curto demais, acho que o problema foi o ritmo que Snyder adotou, ritmo aqui, algo mais profundo do que só dizer: é acelerado ou lento.
Snyder não é lá um graaande diretor e por isto o filme peca por não mostrar bem as coisa spra quem não conheçe a HQ, este é o problema e não a longa duração, gente competente como Terry Gillian pretendia fazer um filme de 3:30 e eu duvido que ficaria ruim só por causa da metragem, alias, tu sou um dos que acham que o filme deveria era ser maior, coisa que ficará na edição do diretor no DVD

"""""Respeito a obra original, mas acho que Snyder deve considerar Watchmen como literatura fundamental. Certo... Ok. """""

e porque não seria?
Watchmen é uma obra-prima, com ou sem filme tentando adaptá-lo


enfim, minha opnião sobre o filme está descrita na minha crítica:
http://bloganimazonando.blogspot.com/

 
At 12:57 AM, março 18, 2009, Blogger Daniel Sanchez said...

"Você está completamente equivocado na sua opinião". "De longe esse é o filme mais maduro sobre super-heróis".

 
At 3:12 PM, março 26, 2009, Anonymous Anônimo said...

Watchmen é um dos maiores clássicos HQ da história.
Eu acho que era um sonho do diretor e de muita gente que leu a HQ na época de lançamento - em 85 se não me engano, ver os personagens em carne e osso. E foi isso que aconteceu. Analisando o filme como um todo você escreveu bem. Ao analisar a intenção do diretor e o que o público espera, acredito que você se equivocou.
E sera que só eu achei a música Hallelujah muito oportuna para aquela cena? Ainda mais analisando o que tinha acontecido com Coruja antes? Eu acho uma das cenas que contém mais humor do filme. O humor que você se referiu que faltou ao filme.
Abraços.
Guilherme

 

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