domingo, maio 11, 2008

Os Caçadores da Arca Perdida


Inspirado nas matinês dos anos 1930, Os Caçadores da Arca Perdida (Raiders of the Lost Ark, 1981) definiu um gênero e apresentou um novo herói do cinema. A palavra "aventura" pode ser analisada antes e depois de Indiana Jones, professor universitário e arqueólogo, que atua como defensor das relíquias históricas como arte. Indy não busca tesouros para benefício próprio, mas para preservá-los como registros concretos da história da Humanidade. Estudioso do passado, Indy jamais se apresenta de forma cética. Pelo contrário, ele não precisa ver para crer e sabe que as possíveis forças sobrenaturais contidas em famosas relíquias não devem ser objetos de estudo e estão além da compreensão do Homem. Para o Dr. Jones, os artefatos pertencem aos museus. Involuntariamente, ele acaba exercendo a função do exército de um homem só a serviço de Deus. Mas tal imagem é concretizada somente no terceiro filme.

Indiana Jones é interpretado brilhantemente por Harrison Ford, que jamais foi considerado como um bom ator. Mas tente imaginar Jones na pele de um Daniel Day-Lewis, por exemplo. Impossível, não? Isso também é mérito da atuação de Harrison Ford, que dá credibilidade à magia que o produtor George Lucas e o diretor Steven Spielberg querem passar.

Os Caçadores da Arca Perdida é uma compilação das aventuras que encantaram Steven e George. Ou seja, o filme é um devaneio da mente e do coração de duas crianças grandes. Na trama iniciada em 1936 - obviamente como homenagem ao gênero demonstrado nas clássicas matinês idolatradas pela dupla de realizadores -, Indy está em busca de um ídolo dourado em algum lugar da América do Sul. O herói enfrenta armadilhas, incluindo uma fuga desesperada de uma pedra gigante, traidores, índios selvagens, salta buracos com o auxílio de seu chicote, passa por teias repletas de aranhas e atravessa passagens segundos antes que elas se fechem para sempre. Numa seqüência vibrante de sons, imagens e pouquíssimos diálogos, o espectador conhece Indiana Jones e já está preso no filme. E a verdadeira trama ainda nem começou.

Ao retornar para sua vida pacata de professor universítário, Jones é chamado para uma reunião com dois representantes do serviço secreto americano. Eles contratam o arqueólogo para encontrar a lendária Arca da Aliança (que guarda os Dez Mandamentos) antes dos nazistas de Hitler. É o bem contra o mal. Steven Spielberg é judeu e nada melhor do que colocar o temido exército alemão da Segunda Guerra Mundial como vilão. Mas os mocinhos não são exatamente os americanos, mas um Indiana Jones apolítico e amante da arqueologia. Porém, falaremos disso depois.

Além da aventura inesquecível, outra jogada de mestre de Steven e George (e Harrison Ford) foi caracterizar Indiana Jones como um herói imperfeito, falível. A alma é dos mocinhos das matinês, mas Indy sangra e se quebra todo para chegar vivo no final. Talvez, pela primeira vez no cinema, um herói sofreu fisicamente e o público notou.

Até conseguir a Arca, Indy vive um intenso "perde e ganha" com os nazistas. O filme não pára. São cenas de ação delirantes e, até então, jamais vistas. A montagem de Michael Kahn tornou a viagem alucinante e ditou o tom do gênero nos anos seguintes. A música de John Williams virou uma lenda e referência de aventura. Após quase 30 anos, Os Caçadores da Arca Perdida ainda é lembrado por diversas cenas memoráveis. O filme nunca envelheceu. Mesmo com efeitos visuais modestos, seu conceito permanece atual. Ao embarcar na trama após os 15 minutos iniciais, você não sai mais. Nem mesmo quando sobem os créditos finais com o tema de John Williams.


Apesar de todas essas referências, Os Caçadores da Arca Perdida permanece atual por um ponto de vista pouco discutido. Os artefatos que Indy persegue são MacGuffins - Alfred Hitchcock popularizou o termo como um objeto que não tem a mínima importância para o espectador, mas que pode valer a vida do protagonista. No caso deste filme, a arca é o MacGuffin. Uma das camadas da genialidade de Steven Spielberg foi divertir o público para discutir um assunto polêmico: a competição (ou corrida) armamentista. Os Caçadores da Arca Perdida não alerta somente para o perigo do poder absoluto nas mãos do Homem, mas alfineta a necessidade bélica de qualquer país desenvolvido. Neste caso, não existem mocinhos nem bandidos.

Movido pela arqueologia, Indy não sabe que está sendo enganado e manipulado pelo próprio país, que não quer ver a arca usada como arma de guerra pelo inimigo alemão. Quando Indy retorna aos EUA, ele quer que a arca vá para um museu, mas o artefato termina confinado numa caixa e armazenado ao lado de tantas outras com o rótulo de "segredo militar". A Alemanha não pode ter uma arma assim nas mãos. Mas os americanos podem.

Parece exagero e talvez Steven Spielberg nem queira entrar na discussão, mas Os Caçadores da Arca Perdida é o único filme da série que termina "triste". Ao mesmo tempo, Indy sai vitorioso e derrotado. Será que, em 1981, Steven alertava o governo americano para os limites de seus próprios poderes? Será que o diretor já previa os dias de hoje? Provavelmente, ele apontou o potencial dos EUA para se erguer como uma nova Alemanha Nazista.

No fim, Os Caçadores da Arca Perdida é lembrado pela diversão ininterrupta, mas esse final me intriga até hoje. Talvez seja um diferencial para os outros filmes da série (e as infinitas imitações), que não discutem nada tão profundo e se concentram exclusivamente na aventura. O que não é problema algum, afinal se aventura tem um nome, este é "Indiana Jones".

Os Caçadores da Arca Perdida
(Raiders of the Lost Ark, 1981)
Direção: Steven Spielberg
Roteiro: Lawrence Kasdan
Elenco: Harrison Ford, Karen Allen, Paul Freeman, Ronald Lacey, John Rhys-Davies, Denholm Elliott, Alfred Molina e Wolf Kahler

11 Comments:

At 8:37 PM, maio 11, 2008, Anonymous Anônimo said...

Otavio, já o temos linkado a algum tempo =)
Gostei da sessão Indiana Jones! Isso é uma contagem regressiva para o novo filme, imagino! Sensacional.
Imaginar George Lucas e Steven Spielberg em um lugar só me dá arrepios. Espero muito que o novo filme faça jus.

Mas uma coisa eu queria comentar. Você disse que Hollywood saída de uma série de fracassos graças a Guerra nas Estrelas. Mas George não precisou montar sua própria empresa (Lucas Arts) para lançar o filme? A glória é de George, e não das produtoras ou Hollywood.

Já foi assistir Speed Racer? Não deixe de comentá-lo!

 
At 9:12 PM, maio 11, 2008, Blogger Otavio Almeida said...

Ainda não vi SPEED RACER. Farei isso durante a semana.

Na verdade, as bilheterias de TUBARÃO e STAR WARS criaram a mania do "verão americano". Com a grana gerada pelos dois filmes em meados dos anos 70, os estúdios descobriram a palavra "blockbuster" e compreenderam que as férias do verão americano significavam uma época lucrativa para filmes de consumo rápido e entretenimento. O público jovem tornou-se importante para a indústria.

Hollywood atrevessava um período de pequenos filmes. Muitos de qualidade... mas a verdade é que o retorno financeiro estava muito fraco. Lucas e Spielberg mudaram a indústria ao implementarem uma consciência: a necessidade da existência de blockbusters para a sustentação de Hollywood.

Lucas desenvolveu a Industrial Light & Magic e começou a consolidar todas as divisões da Lucasfilm com a grana do primeiro STAR WARS. Para desenvolver esse império, ele deixou a direção dos dois STAR WARS seguintes de lado.

Abs!

 
At 9:20 PM, maio 11, 2008, Blogger Dr Johnny Strangelove said...

Isso não é um filme ...
é algo unico ... imagino quem viu no cinema o orgulho em dizer ... vi um filme de Indiana no cinema ...

E DIA 22 TÓ LÁ CARAIOOOOOO!!!


e Os Caçadores da Arca Perdida é algo inexplicavel ... uma porta para a fantasia foi aberta e esperamos que nunca se fecha ...

 
At 1:05 AM, maio 12, 2008, Anonymous Anônimo said...

Essa análise sobre o final do filme é algo bem interessante e algo que eu já tinha pensado. Eu fico pensando se o Spielberg e o Lucas tinham uma visão diferente do trabalho deles e se deveriam utilizá-lo para outro fim, o que se tornou completamente dispensável com as cifas gigantescas que seus filmes puramente técnicos e emocionantes proporcionam... Mas não acho que o cinema tenha perdido em muito devido a essa mudança, talvez a sociedade, rs... Parabéns pela resenha e pelo questionamento...

 
At 12:36 PM, maio 12, 2008, Anonymous Anônimo said...

Como disse no post anterior, "Os Caçadores da Arca Perdida" é meu favorito na série (ainda que muitos prefiram o terceiro capítulo). Sem dúvida um excelente filme que para mim é o segundo melhor do Spielberg. Abraço!

 
At 1:01 PM, maio 12, 2008, Blogger Unknown said...

O nono melhor filme entre os meus favoritos de todos os tempos. Diversão inteligente e de primeira, coisa cada vez mais rara no cinema. Harrison Ford absoluto como Indiana Jones, numa direção apoteótica de Spielberg.
Abraço!

 
At 1:46 PM, maio 12, 2008, Blogger Rodrigo Fernandes said...

Cara e pensar que irei assistir a um filem desse lendário herói, nos cienmas, com som e imagem digna de sua potencialidade... memso que aidna seja infinitamente inferior a produção, heheh... mas já é melhor do que numa tela 16:4...rs...
fantástico... vou ver se consigo pegar esse e os demais da série, pra fazer uma maratona, já que faz tmepo que os vi...
abraços!!! Ah, excelente homenagem a sua, nada como ficar aidna mais ansioso com a estreia depois de ver seu blog..rs

 
At 4:17 PM, maio 12, 2008, Blogger Kamila said...

Como disse no post anterior, assistir a este "Os Caçadores da Arca Perdida" foi um verdadeiro prazer. Me diverti muito com a trama, os personagens e adorei o casal Indiana e Marion Ravenwood.

Beijos!!

PS: Não sei se isso acontece só comigo, Otavio, mas estou com problemas para visualizar o Hollywoodiano. A página está abrindo, mas seu template não é mostrado de forma completa. Só vejo o fundo cor de vinho....

 
At 7:22 PM, maio 12, 2008, Blogger Otavio Almeida said...

É mesmo, Kamila? Desde quando? Alguém mais está com esse problema?

Abs!

 
At 12:22 PM, maio 13, 2008, Anonymous Anônimo said...

Muito bom texto, Otávio. De todos os Indianas esse é o que mais gosto devido ao seu final sombrio. Será que o novo filme terá alguma crítica velada, já que pelo que vi no trailer the nazis are back...

 
At 11:33 PM, maio 15, 2008, Anonymous Anônimo said...

Belíssimo blog Otávio, e uma lembrança oportuna. Estou começando a relembrar a trilogia também no meu blog - convido a ler o post em www.porfalaremcinema.wordpress.com

Adicionando o Hollywoodiano ä minha lista no blog...
Abraço

 

Postar um comentário

<< Home