domingo, outubro 21, 2007

O Assassinato de Jesse James

31ª Mostra Internacional de Cinema

Jesse James foi um dos homens mais procurados pelas autoridades norte-americanas no século XIX. O bandido roubou e matou inimigos (e amigos) pela frente e pelas costas. Mas a história não marcou Jesse James como um covarde. Ele teria sido uma celebridade do Velho Oeste. Seu mito intrigou os paparazzi da época. Os cartazes pedindo recompensas por sua cabeça, os contos não-oficiais sobre sua saga e toda a propaganda boca-a-boca em torno de seus feitos transformaram Jesse em astro. Mas para tornar sua imagem imortal faltava algo que, infelizmente, marca a trajetória de muitos ídolos: a morte.

Como diz no título do filme do diretor Andrew Dominik, O Assassinato de Jesse James Pelo Covarde Robert Ford (The Assassination of Jesse James By the Coward Robert Ford, 2007), você sabe que ele já morreu. E quem o matou. Seu colega mais novo do bando James atirou no ídolo pelas costas. Isso não é contar o final. É fato. Pelo menos, como deixaram registrado. Só que o jovem e confuso Robert Ford não entrou para a História como um herói. Ele ficou marcado como covarde.

Onde ele errou? E onde Jesse James acertou? Trata-se de brilho próprio, classe ou estilo. Como o filme conta, Jesse matou e jamais correu em direção à imprensa para anunciar seus feitos. Ford fez isso. Quis ser famoso de algum jeito como o ídolo, a quem amava e odiava ao mesmo tempo. Só que ele ganhou o desrespeito e a difamação. Do ponto de vista do "covarde", a História é ingrata. O problema é que para entender essa parte mais importante do filme, temos apenas 20 do 160 minutos de projeção.

O diretor Andrew Dominik (que havia dirigido apenas um longa pouco visto, Chopper, de 2001) parte do momento em que Jesse James (Brad Pitt) e seu bando fizeram o último assalto. Seu irmão, Frank (Sam Shepard), estava cansado e queria deixar a vida de crimes para trás. Nessa oportunidade, Frank reconhece a fragilidade do inexperiente Robert Ford (Casey Affleck), que pede para integrar a equipe de sidekicks dos James. Ele não aceita. Como os irmãos se falavam pouco e uma certa rivalidade pela liderança do bando gerava um certo atrito entre eles, acredito que a intervenção de Jesse, ao colocar seu futuro assassino no grupo, tenha sido proposital. Mas até a conclusão emocionante e poderosa dos 20 minutos finais, que realmente definem a mensagem do filme, o diretor perde tempo demais com tramas paralelas envolvendo os outros membros do bando. Com a proposta do clímax, o drama seria muito mais forte se o roteiro se concentrasse nos irmãos Charley (Sam Rockwell) e Robert Ford, além de Jesse James. Até cerca de 140 minutos, Dominik "mostra" o filme. Nos últimos (e importantíssimos como cinema) 20 minutos, ele só "conta".

As questões que deveriam ser levantadas com um roteiro mais enxuto envolvem a admiração de Ford por James. Talvez o "covarde" fosse apaixonado pelo famoso bandido. Se não poderia ter um romance com James, matá-lo seria o ato mais íntimo que ele alcançaria. Mas os motivos que levam a isso, incluindo a vontade do próprio James de ir ao encontro da morte, são apenas sugeridos. O que não seria um problema, mas a insistência de acompanhar a vida dos outros integrantes do bando deixa uma "barriguinha" no filme. E irrita.

Um diretor mais experiente teria mantido essas idéias e cortado os excessos, porque O Assassinato de Jesse James Pelo Covarde Robert Ford era um material perfeito para construir uma obra-prima. Desde a belíssima fotografia de Roger Deakins (favorita ao Oscar), passando pela emocionante trilha sonora de Nick Cave e Warren Ellis à dedicação do elenco, além da cultuada história. De cara, parecia que Dominik ia acertar, pois não se trata de um faroeste tradicional. É um filme com planos longos, seqüências silenciosas e paisagens embriagantes. Ainda mais por suas 2h40 de duração, o filme se assume como um épico. Mas imagina como seria o resultado nas mãos de Terrence Malick, de Além da Linha Vermelha? Ele era o cineasta ideal para filmar O Assassinato de Jesse James Pelo Covarde Robert Ford como um "faroeste diferente". Mas Dominik ainda não é Malick. E acho que jamais será.

Vale pela fotografia, pela música e as atuações de Casey Affleck e Brad Pitt, que ganhou o prêmio de Melhor Ator no último Festival de Veneza. O astro está realmente bem como um Jesse James exausto e enigmático. Ele é um sujeito simples perto da mulher e dos filhos. Um pai dedicado e carinhoso com suas crianças, mas capaz de explodir até mesmo com o sobrinho de um de seus "amigos". Ele consegue deixar a raiva dominar sua simpatia em questão de segundos. Pelo olhar de Pitt, imaginamos o que James pensa da morte naquele momento de sua vida: é a melhor forma para entrar na eternidade. E o que vale mais? A arte ou a vida? Não quero dizer que ele merece um Oscar, mas Brad Pitt está de parabéns.

Já Casey Affleck merece uma indicação de Melhor Ator Coadjuvante. Ele faz um Robert Ford, que fala para dentro, mas que aos poucos aprende a se soltar. Ele passa de carinhoso e inocente para invejoso e desprezível ao longo do filme. Como se ele acreditasse no resultado da montagem final (e ideal) do roteiro. Mas nem ele e nem Pitt merecem os exageros do diretor Andrew Dominik.

O Assassinato de Jesse James Pelo Covarde Robert Ford
(The Assassination of Jesse James By the Coward Robert Ford, 2007)
Direção: Andrew Dominik
Elenco: Brad Pitt, Casey Affleck, Sam Rockwell, Garret Dillahunt, Paul Schneider, Sam Shepard e Mary-Louise Parker

10 Comments:

At 3:42 PM, outubro 21, 2007, Blogger Kamila said...

Otavio, existe uma certa controvérsia em relação ao posicionamento do Casey Affleck nesta award season. Muita gente acha que ele é principal, mas está sendo promovido como coadjuvante. O que achas?

Parece que a produção desse filme foi bem complicada. O Dominik editou-o algumas vezes até chegar ao ponto em que queria. E, pelo que seu texto indica, o problema do filme é mesmo o diretor.

Bom domingo!

 
At 7:18 PM, outubro 21, 2007, Anonymous Anônimo said...

Belo texto, Otavio! Tenho grande interesse pelo filme, mesmo desconfiando desse tipo de produção em que já sei o final (mas me surpreendi com "Zodíaco", então acho que possa valer a pena pela forma como a trama for desenvolvida). Acho que o maior destaque deve ser mesmo sua técnica, além do elenco - torço bastante para o Casey Affleck nas premiações, seja por esse filme, seja por "Medo da Verdade". E se tiver metade da competência de um autêntico Malick, já valerá a pena...

Abraço!

 
At 9:19 PM, outubro 21, 2007, Blogger Wiliam Domingos said...

O filme não me interessa muito...
Mas parece ser um prato cheio para discussões!
Pelo que percebi, de uma idéia e história não tão simples fez se um filme ainda mais complicado e "enrolador"...precisava mesmo de 2hr40min!?
Enfim...estou falando sem ter visto! então...
Abraço!

 
At 10:36 AM, outubro 22, 2007, Blogger Otavio Almeida said...

É, gente... não precisava de 2h40.

Acho que o Casey Affleck é coadjuvante. Mas não sei como vão indicá-lo.

Descobri que o Andrew Dominik foi diretor de comerciais... e isso explica tudo. O filme parece comercial de sabonete.

Abs! Boa semana!

 
At 11:14 AM, outubro 22, 2007, Blogger Kamila said...

Otavio, até agora o Casey está como coadjuvante por "O Assassinato de Jesse James" e principal por "Gone Baby Gone". Acho que vai continuar assim, até mesmo para ele não correr o risco de dividir votos.

Obrigada e boa semana para você também!

 
At 2:56 PM, outubro 23, 2007, Blogger Otavio Almeida said...

Não conhecia esse GONE BABY GONE...

 
At 5:03 PM, outubro 23, 2007, Blogger Otavio Almeida said...

Ah... é o tal MEDO DA VERDADE, do Ben Affleck...

 
At 6:29 PM, outubro 25, 2007, Blogger Museu do Cinema said...

Não sei o que é, mas só leio o título desse filme como O Assassinato de Jesse James pelo covarde Robert Redford.

 
At 10:11 AM, outubro 26, 2007, Blogger Otavio Almeida said...

Não coube no título com as estrelinhas...

 
At 10:12 AM, outubro 26, 2007, Blogger Otavio Almeida said...

Ah, entendi... REDFORD! Legal!

 

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