sexta-feira, abril 11, 2008

O Reino


Depois do 11 de setembro, ficou muito difícil engolir os americanos como os heróis ou salvadores do mundo. Na tela do cinema ou na vida real. Tanto faz. O Reino (The Kingdom, 2007), do também ator Peter Berg, veio na onda dos filmes hollywoodianos que analisam os conflitos no Oriente Médio - a produção foi lançada na época de Leões e Cordeiros, que aliás tem o mesmo roteirista (Matthew Michael Carnahan), e Jogos do Poder, mas é a pior da remessa.

É ruim porque parte do princípio de que o mundo ainda vê os jogadores de futebol com as mãos como mocinhos no cenário de disputas internacionais. Além disso, O Reino tenta passar a imagem de que é um filme sério em forma de thriller político, mas é um festival de ação enrustido e sem cérebro. Começa como um CSI Riyadh e termina como Rambo. Um detalhe: qualquer filme da série com Sylvester Stallone é melhor.

Até que o longa começa com uma abertura legal, que explica, durante os créditos, como o reino da Arábia Saudita foi criado, passando pela descoberta do petróleo até chegar ao infame 11 de Setembro. Mas tudo é tão rápido, que é preciso voltar o DVD algumas vezes para pegar o conteúdo. Se isso fosse base de estudo para uma prova, eu tiraria nota zero.

Mas não se preocupe, afinal estamos falando de Hollywood e essa aulinha não tem importância alguma no restante do filme, que narra as investigações de uma equipe de agentes do FBI (Jamie Foxx, Jennifer Garner, Chris Cooper e Jason Bateman) em Riyadh, na Arábia Saudita, depois que uma colônia ianque é mandada pelos ares num ataque terrorista.

Está certo que um filme estrelado por Jennifer Garner já é meio caminho andado, mas não precisava exagerar na ruindade e nos clichês. Jason Bateman, filho da engraçadíssima série de TV Arrested Development, não tem pinta de agente do FBI, certo? Então, o que ele pode fazer é soltar uma piada por minuto, claro. Ele é o tradicional alívio cômico de O Reino. Jennifer Garner é a donzela da equipe. Ela se impressiona facilmente e chora para demonstrar emoção. Mas se você já viu Alias, sabe que a garota também é capaz de atirar na hora certa. Chris Cooper é o intelectual da equipe. Ele é uma espécie de Locke (da série Lost) neste filme. Já Jamie Foxx é obviamente o cara durão da história, que bate e atira, mas pergunta depois. Seu nome no filme é Ronald Fleury (e é muito engraçado ouvir os atores pronuciando "Fleury"). Foxx é dono de uma das falas mais americanas e ultrapassadas neste tipo de produção. É algo como: "Deixe-nos fazer nosso trabalho. Somos bons nisso." Dã! Parece saudosismo ianque de segunda categoria. Nos anos 1980, o lema era "Me engana, que eu gosto" (meu avô dizia isso), mas agora não me venha com essa.

Depois da tentativa de mostrar ao público que O Reino é um thriller sério, o diretor parte para a ação frenética nos minutos finais. Não chega a ser um desastre neste caso, afinal o tratamento dado ao filme antes de seu último ato funciona como um remédio para dormir. Acho que até o público que acreditava na proposta de um filme dramático e tenso, não agüentava mais tanta conversa fiada. Mas aí vem o despertador em forma de ação. É hora de correria, tiros e bombas para todos os lados de um jeito que você já viu em várias produções. O que nos leva ao parágrafo abaixo.

É impressionante como, muitas vezes, Hollywood liga a edição e a fotografia de um filme no piloto automático. Explico: O Reino é dirigido por esse Peter Berg, mas poderia ser um filme de Michael Bay (A Rocha, Bad Boys, A Ilha, Transformers) ou qualquer pau mandado do produtor Jerry Bruckheimer (Con Air, A Lenda do Tesouro Perdido, Armageddon). Ninguém ia notar a diferença em detalhes como câmera lenta, luz do sol estourada, poluição visual e coisas do tipo.

O pior de tudo é que O Reino não é uma obra de Jerry Bruckheimer ou Michael Bay, que teriam assumido a produção como diversão escapista. E eu diria aqui que o homem por trás deste filme não passa de um robozinho sem alma e personalidade fazendo exatamente o que o estúdio quer. Mas essa é uma produção de Michael Mann, diretor de grandes filmes como Fogo Contra Fogo, O Informante e Colateral. Ele pode ser talentoso, mas é um ser humano que também erra. E infelizmente, o Michael Mann de O Reino é o mesmo de Miami Vice.

O Reino (The Kingdom, 2007)
Direção: Peter Berg
Roteiro: Matthew Michael Carnahan
Elenco: Jamie Foxx, Chris Cooper, Jennifer Garner, Jason Bateman, Ashraf Barhom, Ali Suliman e Jeremy Piven

8 Comments:

At 7:05 PM, abril 11, 2008, Blogger Kamila said...

Poxa, Otavio, o Peter Berg é responsável por "Friday Night Lights", um dos melhores filmes baseados em esportes que eu já vi e o qual serviu como inspiração para a série de mesmo nome. Ele é talentoso e prova isso naquela cena magnífica do atentado terrorista no bairro residencial.

Queria até poder comentar "O Reino" de uma melhor maneira, mas parei de assistir ao filme no momento em que os agentes do FBI iam embarcar para a Arábia Saudita.

E não parei de assistir ao filme por causa da qualidade. Até que eu estava gostando.

Bom final de semana!

 
At 7:20 PM, abril 11, 2008, Anonymous Anônimo said...

Também achei fraquíssimo. Nem fiquei tão incomodado com esses outros filmes com tema Oriente Médio, visto que ao menos tinham algo de positivo, mas "O Reino" tenta contar uma trama de contexto sério através de uma típica fita de ação com tiros e explosões. Adorei o último parágrafo. Abraço!

 
At 12:35 AM, abril 12, 2008, Anonymous Anônimo said...

Concordo que é o mais fraco da "arremessa", mas eu até que gostei. Muito falho, demais até, mas eu achei as sequências de ação pelo menos bem dirigidas, com destaque à montagem. O problema é que eu sei que fui manipulado demais pelo filme, e que numa revisão eu veria ainda mais defeitos. O filme pode ser resumido em sua cena final, com boas intenções, entrega válida lição, mas é forçado, além de pretentioso.

Bonzinho apenas.

Ciao!

 
At 4:22 AM, abril 12, 2008, Blogger Rodrigo Fernandes said...

ahaha, já curti o tal do CSI Riyadh, ótimo, heheh
Já passei por esse filme umas três vezes na locadora mas não o levei... agora irei fazer, mesmo com sua nota e seu comentário, Otávio, pois até então não tinha lido nada sobre ele de forma contundente, com argumentos tão interessantes como os seus...
Mesmo achando que devo tbm ter as mesmas opiniões que as suas, irei ver o filme, irei arriscar.. será que depois pode pedir o dinehiro de volta pra mocinha da locadora? heheh
abraços

 
At 12:03 PM, abril 12, 2008, Blogger Pedro Henrique Gomes said...

Uma estrela só?
Ainda não vi, acho que nem vou alugar hoje...

Bom final de semana!!!

 
At 1:08 PM, abril 12, 2008, Blogger Museu do Cinema said...

Acho que tem alguns filmes com esse nome. Eu confesso que gostei do trailer, mas não a ponto de me levar aos cinemas.

 
At 9:45 AM, abril 13, 2008, Blogger Dr Johnny Strangelove said...

Rapaz, estava tão convencido de que tinha visto um filme essencialmente americano quemiando total o sistema que foi Leões e Cordeiros e só estava empolgado por que era do mesmo roteirista ... mas quando vi o filme, além de ter quebrado a cara, vi um dos momentos mais ufanistas e ridiculos da história ...

e quando terminei a sessão, a primeira coisa que pensei foi ... meu dinheiro ... MEU DINHEIROOOOOOO

 
At 4:53 PM, julho 07, 2008, Blogger Prof. Ká said...

Vcs vão me perdoar, mas o filme é bom.
POde exagerar em mostrar os sauditas como "do mal" ... mas deixa a mensagem de que os dois lados estão certos de acordo com seu prisma.... e se vcs não entenderam isso pelo amor de Deus!

 

Postar um comentário

<< Home