terça-feira, fevereiro 27, 2007

Como ficam os novos Infiltrados depois do Oscar?

Recentemente, Mark Wahlberg e o roteirista oscarizado William Monahan andaram falando demais sobre transformar Os Infiltrados em uma franquia. Mas depois do Oscar de Melhor Filme, a Warner levaria essa idéia adiante? Todo cuidado é pouco, afinal seqüências de produções vencedoras da principal estatueta dourada são raras e a qualidade é sofrível - as únicas exceções seriam O Poderoso Chefão II e III (1974/1990).

Apesar do original de Hong Kong, Conflitos Internos (2002), ter um prelúdio e uma continuação, Monahan acha que Os Infiltrados é uma construção pessoal e pode seguir caminhos diferentes. "As pessoas falam da seqüência, mas eu poderia escrever um 'filme policial de Boston' e vendê-lo por um valor maior do que eu conseguiria por uma seqüência. Eu escreverei sobre Boston até o resto da minha vida. Se será ou não na forma de um filme derivado de Os Infiltrados, quem decide são outras pessoas", revela o roteirista.

Já Mark Wahlberg se empolgou ao declarar que voltaria para mais dois filmes protagonizados pelo policial Dignam (por motivos óbvios). Sobre o provável prelúdio, Wahlberg escancara: "Todo mundo está a bordo. Queremos começar assim que a tinta do roteiro secar, enquanto Jack Nicholson não está velho demais para interpretar o jovem Costello. Nós veremos sua ascensão na máfia irlandesa e a formação da equipe de Queenan (Martin Sheen)". Sobre a continuação, ele diz: "Haverá uma investigação governamental e a sujeira levará ao senador que deve ser interpretado por Robert De Niro".

Embora seja tentador ver Martin Scorsese e De Niro juntos novamente, a idéia de continuar Os Infiltrados não me agrada, mas parece que isso pode acontecer. Espera-se que os materiais sejam tratados com muito respeito. Marty ainda não confirmou se vai dirigir os novos filmes. Ele até fez A Cor do Dinheiro (1986), que continua a saga de Eddie Felson, personagem de Paul Newman em Desafio à Corrupção (1961), de Robert Rossen, mas jamais comandou seqüências para seus filmes originais.

De qualquer forma, as adaptações de filmes orientais estão em alta entre os envolvidos. Leonardo DiCaprio revelou que uma versão americana para o policial Seung Sing, também dirigido por Andrew Lau e Alan Mak (Conflitos Internos), está em seus planos como ator e produtor. O próprio William Monahan deve escrever o roteiro.

segunda-feira, fevereiro 26, 2007

O Oscar e os bons companheiros

Depois da euforia pela vitória de Martin Scorsese, finalmente coloquei os pés no chão para analisar a premiação de ontem. Sei que alguns discordam do Oscar dado a Marty, mas seria pior se a Academia premiasse o lendário diretor por um filme vergonhoso ou que não fosse digno de sua carreira.

Os Infiltrados é Scorsese na veia! É o Scorsese das ruas! Sujo, violento e poético! Esse é um dos cinco melhores trabalhos de sua carreira. Foram 4 Oscar (Filme, Diretor, Roteiro Adaptado e Montagem - sua colaboradora na edição, Thelma Schoonmaker é a melhor no que faz). A imagem dos abraços de Coppola, Spielberg, George Lucas e Jack Nicholson no backstage foi um momento histórico. Quando teremos outro grupo desse calibre para revolucionar o cinema? Só acho que Marty esqueceu de citar Robert De Niro nos agradecimentos. Mas tudo bem.

No mais, a avassaladora Helen Mirren levou mesmo a estatueta de Melhor Atriz por A Rainha. Seu porte é magnífico nas telas e na vida real. Como previsto, Forest Whitaker ganhou como Melhor Ator por O Último Rei da Escócia. É um grande talento que também acaba reconhecido de forma tardia. Só foi uma pena que Peter O' Toole tenha saído novamente de mãos vazias. Em breve, ele estará em Stardust, fantasia baseada na obra de Neil Gaiman. Quem sabe ele ganha outra chance? Seu olhar de decepção quando Reese Witherspoon anunciou Whitaker foi de congelar o coração. Ainda não vi O Último Rei da Escócia, mas não dá para duvidar muito do que dizem sobre sua atuação.

Parece que Jennifer Hudson, a vencedora da estatueta de Melhor Atriz Coadjuvante anda conversando com gente boa como Spike Lee e Quentin Tarantino sobre seu futuro. Tomara que sua carreira decole com o Oscar. Eddie Murphy não merecia mesmo ganhar. A vitória de Alan Arkin (Pequena Miss Sunshine) como Melhor Ator Coadjuvante foi justa e coroou um nome marcante na indústria.

Em outras categorias, não entendi bem como O Labirinto do Fauno recebeu três Oscar, mas nenhum deles para Melhor Filme Estrangeiro. Coisas da Academia. Outra que não deu para entender foi a premiação de Maria Antonieta como Melhor Figurino. Não pode ganhar filme contemporâneo como O Diabo Veste Prada?

E Babel? Onde foi parar? O prêmio solitário de Melhor Trilha Sonora é a glória do compositor argentino Gustavo Santaolalla. É o segundo ano consecutivo que ele ganha nessa categoria (em 2006, recebeu o Oscar por O Segredo de Brokeback Mountain). Foi um Oscar pela admiração da indústria por seu imenso talento. Não exatamente por Babel. Em Melhor Animação, a Academia decidiu quebrar o monopólio da Pixar e premiou Happy Feet. É um belo filme, mas não necessariamente superior a Carros. Páreo duro...

Enfim, a noite ficou marcada pelo Oscar para Martin Scorsese e pela careca (!) de Jack Nicholson. Agora é bola pra frente. Hora de deixar as premiações de lado e voltar os olhos definitivamente para o que vem por aí em 2007. Sexta estréia Motoqueiro Fantasma... O que vai sair disso?

And the Oscar Goes to... Martin Scorsese

Foi sensacional! Que noite inesquecível! E que momento mágico presenciar Martin Scorsese receber o Oscar! Finalmente, o diretor de filmes que mudaram o cinema como Caminhos Perigosos (1973), Taxi Driver (1976), Touro Indomável (1980) e Os Bons Companheiros (1990) foi reconhecido pela Academia. Antes tarde do que nunca. Sem essa de que Os Infiltrados não é o seu melhor trabalho. Fazer o quê? Voltar no tempo e tirar a estatueta de Robert Redford (Gente Como a Gente) e entragá-la a Marty, que na época concorria por Touro Indomável? Como disse a jornalista Ana Maria Bahiana, Os Infiltrados pode ter sido um projeto de encomenda, mas O Poderoso Chefão, de Coppola, também foi.

Quando Francis Ford Coppola, Steven Spielberg e George Lucas surgiram no palco para anunciar a categoria de Melhor Diretor, a vitória de Marty se concretizou. Faltou só Brian De Palma estar ali para formar, com esses nomes, os grandes revolucionários da indústria cinematográfica nos anos 70. Ovacionado de pé, Marty viu o Kodak Theater ir à loucura. Seu agradecimento fica para sempre. Com a emoção no backstage ao encontrar o colega Jack Nicholson e sua conversa alucinante com Steven Spielberg, Marty acabou nem ouvindo a cereja do bolo: o Oscar de Melhor Filme para Os Infiltrados. Quem diria? A Academia fez tanto suspense e escolheu realmente o melhor. Uma noite quase perfeita.

A homenagem tardia a Ennio Morricone foi de encher os olhos e os demais vencedores eram quase todos favoritos - exceto por Alan Arkin (Pequena Miss Sunshine), que merecidamente desbancou Eddie Murphy (Dreamgirls) como Melhor Ator Coadjuvante. Abaixo, todos os ganhadores do 79º Oscar. Parabéns, Marty!


Melhor Filme
Os Infiltrados

Melhor Diretor
Martin Scorsese (Os Infiltrados)

Melhor Roteiro Original
Pequena Miss Sunshine

Melhor Roteiro Adaptado
Os Infiltrados

Melhor Ator
Forest Whitaker (O Último Rei da Escócia)

Melhor Atriz
Helen Mirren (A Rainha)

Melhor Ator Coadjuvante
Alan Arkin (Pequena Miss Sunshine)

Melhor Atriz Coadjuvante
Jennifer Hudson (Dreamgirls – Em Busca de um Sonho)

Melhor Filme Estrangeiro
The Lives of Others (Alemanha)

Melhor Animação
Happy Feet – O Pingüim

Melhor Trilha Sonora
Babel

Melhor Canção
I Need to Wake Up (Uma Verdade Inconveniente)

Melhor Fotografia
O Labirinto do Fauno

Melhor Montagem
Os Infiltrados

Melhor Direção de Arte
O Labirinto do Fauno

Melhor Figurino
Maria Antonieta

Melhor Maquiagem
O Labirinto do Fauno

Melhores Efeitos Visuais
Piratas do Caribe – O Baú da Morte

Melhor Mixagem de Som
Dreamgirls – Em Busca de um Sonho

Melhor Edição de Som
Cartas de Iwo Jima

Melhor Documentário
Uma Verdade Inconveniente

Melhor Documentário (Curta)
The Blood of Yingzhou District

Melhor Curta-Metragem
West Bank Story

Melhor Curta de Animação
The Danish Poet

sexta-feira, fevereiro 23, 2007

O Oscar mais imprevisível dos últimos tempos

Nessa altura, não dá tempo para mais nada. Os envelopes estão lacrados e é hora de especular o que pode acontecer no Kodak Theater neste domingo, dia 25 de fevereiro. Quem é favorito ao Oscar mais imprevisível dos últimos anos? Chegou o grande momento do mestre Martin Scorsese? Ou a Academia vai passar a perna no bom velhinho? Forest Whitaker é mesmo favorito ao Oscar de Melhor Ator? Parece que Peter O' Toole (Vênus) e Leonardo DiCaprio (Diamante de Sangue) ganharam muitos votos.

Mesmo com as escolhas de sindicatos, críticos e, claro, o Globo de Ouro, o prêmio da Academia deste ano pode ir para qualquer um. Sério. Em 2006, O Segredo de Brokeback Mountain perdeu a estatueta de Melhor Filme para Crash, mas ao menos chegou como favorito.

Abaixo, faço uma pequena análise das categorias principais e arrisco alguns palpites. Crianças, por favor, não façam isso em casa. Segunda-feira, essas apostas podem ter ido para o brejo, mas vamos lá.

Melhor Filme

Quem deve ganhar: Pequena Miss Sunshine. É o filme mais leve e agradável entre os indicados. Como quase todo mundo gosta da comédia de Jonathan Dayton e Valerie Faris, isso pode ser decisivo. Mas Babel e Os Infiltrados também têm chances.

Quem deveria ganhar: Os Infiltrados. Em 20 anos, os cinéfilos vão olhar a lista de indicados deste Oscar e o filme de Martin Scorsese será lembrado como clássico. Cartas de Iwo Jima é o meu segundo favorito.

Melhor Diretor

Quem deve ganhar: Martin Scorsese (Os Infiltrados). Seria o primeiro Oscar do diretor de Caminhos Perigosos, Taxi Driver, Touro Indomável e Os Bons Companheiros. Uma vergonha para a Academia que pode ser corrigida neste domingo.

Quem deveria ganhar: Martin Scorsese (Os Infiltrados). Marty perdeu anteriormente para Robert Redford (Gente Como a Gente) e Kevin Costner (Dança Com Lobos) quando ele concorria, respectivamente, por Touro Indomável e Os Bons Companheiros. Não é mentira não. Tudo bem que ele tenha perdido para Clint Eastwood (Menina de Ouro), em 2005, quando estava indicado por O Aviador, mas pelo amor de Deus...

Melhor Roteiro Original

Quem deve ganhar: Pequena Miss Sunshine. O roteiro de Michael Arndt é o grande segredo do filme, mas enfrenta dois concorrentes fortíssimos - Peter Morgan (A Rainha) e Guillermo Arriaga (Babel).

Quem deveria ganhar: Pequena Miss Sunshine. Você também saiu sorrindo da sessão de Pequena Miss Sunshine? Cortesia de um roteiro simples e direto escrito por Michael Arndt.

Melhor Roteiro Adaptado

Quem deve ganhar: Os Infiltrados. Depois de escrever Cruzada para Ridley Scott, William Monahan adaptou o longa de Hong Kong (Conflitos Internos) para o ocidente e entregou um material de primeira com a cara de Martin Scorsese.

Quem deveria ganhar: Os Infiltrados. É o policial com as mesmas intrigas entre tiras e criminosos do passado, mas com uma roupagem para o novo milênio.

Melhor Ator

Quem deve ganhar: Forest Whitaker (O Último Rei da Escócia). Ignorado pela bela atuação em Bird, de Clint Eastwood, em 1989, essa é a oportunidade perfeita para a Academia reparar o erro e premiar um ator de verdade. Mas fontes garantem que Peter O' Toole (Vênus) e Leonardo DiCaprio (Diamante de Sangue) ganharam muitos votos nos últimos dias.

Quem deveria ganhar: Ficaria feliz pela vitória de Peter O' Toole. Oito indicações e nada para o eterno Lawrence da Arábia? Mas não tiro da cabeça que a ausência de Ken Watanabe (Cartas de Iwo Jima) é um absurdo. E Sacha Baron Cohen, por Borat, também merecia uma indicação...

Melhor Atriz

Quem deve ganhar: Helen Mirren (A Rainha). É simplesmente uma das maiores atuações do cinema.

Quem deveria ganhar: Meryl Streep (O Diabo Veste Prada) - porque também é uma das maiores atuações do cinema.

Melhor Ator Coadjuvante

Quem deve ganhar: Eddie Murphy (Dreamgirls). Gosto muito do Eddie Murphy dos tempos de Um Tira da Pesada e Trocando as Bolas. O Eddie Murphy de hoje é lamentável e seu trabalho em Dreamgirls é superestimado e baseado em imitação barata de James Brown.

Quem deveria ganhar: Alan Arkin (Pequena Miss Sunshine). Apesar da ausência inacreditável de Jack Nicholson (Os Infiltrados), o vovô que Arkin criou para o adorado Pequena Miss Sunshine permanece na memória até o fim do filme.

Melhor Atriz Coadjuvante

Quem deve ganhar: Jennifer Hudson (Dreamgirls). Ela canta demais e é mesmo boa atriz. Mas é um exagero ganhar um Oscar por seu primeiro trabalho nas telas. Que sirva de incentivo para uma carreira promissora...

Quem deveria ganhar: Abigail Breslin (Pequena Miss Sunshine). Desde 1994, quando Anna Paquin ganhou nessa categoria por O Piano, que uma criança não leva a estatueta dourada. Qual é o problema? Mais filmes que Jennifer Hudson ela tem...

Onde assistir ao Oscar pela TV na noite de 25 de fevereiro?


- E! Entertainment Television

Às 14h, os especialistas do canal já comentam a festa.
Às 20h, Ryan Seacrest e Giuliana DePandi comandam as entrevistas no Tapete Vermelho.
Às 2h, o canal invade as festas dos estúdios e conversa com os vencedores do Oscar.

- TNT

Às 21h, o canal analisa a chegada das celebridades no Tapete Vermelho.
Às 22h, Rubens Ewald Filho comenta a transmissão ao vivo da cerimônia de entrega das estatuetas.

- Globo
Com apresentação de Maria Beltrão e comentários de José Wilker, o canal só inicia a transmissão da cerimônia quando acabar aquele Big Brother Brasil.

quinta-feira, fevereiro 22, 2007

1º Movie Bloggers Awards

E meu colega Victor Nassar do blog Pipoca Com Manteiga criou esse Movie Bloggers Awards. Em sua primeira edição, o prêmio contou com votos de 17 blogueiros – alguns deles estão nos links situados ao lado direito desta página -, incluindo HOLLYWOODIANO. Se críticos e sindicatos podem, nós também podemos. Não há qualquer lobby, apenas escolhas de pessoas apaixonadas pela sétima arte.

Assim como este blog
listou os seus favoritos em diversas categorias (veja aqui), o 1º Movie Bloggers Awards revela os melhores de 2006 – consideramos os filmes em cartaz no Brasil de 1º de janeiro a 31 de dezembro do ano passado.

Melhor Filme
Pequena Miss Sunshine

Melhor Diretor
Martin Scorsese (Os Infiltrados)

Melhor Roteiro
Pequena Miss Sunshine

Melhor Ator
Leonardo DiCaprio (Os Infiltrados)

Melhor Atriz
Meryl Streep (O Diabo Veste Prada)

Melhor Ator Coadjuvante
Jack Nicholson (Os Infiltrados)

Melhor Atriz Coadjuvante
Abigail Breslin (Pequena Miss Sunshine)

Melhor Trilha Sonora
O Segredo de Brokeback Mountain

Melhor Fotografia
O Segredo de Brokeback Mountain

Melhor Montagem
Os Infiltrados

Melhor Direção de Arte
O Labirinto do Fauno

Melhor Figurino
O Diabo Veste Prada

Melhor Maquiagem
O Labirinto do Fauno

Melhores Efeitos Visuais
Piratas do Caribe – O Baú da Morte

Melhor Som
Superman – O Retorno

Borat


Não é de hoje que o cinema aposta em comédias politicamente incorretas. Muitas exageram e deixam qualquer compromisso artístico de lado – nada de bons roteiros ou atores inspirados. Mesmo sem cérebro, o importante é fazer o público rir. Por essas e outras razões, não é injusto dizer que Borat – O Segundo Melhor Repórter do Glorioso País Cazaquistão Viaja à América (Borat – Cultural Learnings of America for Make Benefit Glorious Nation of Kazakhstan, 2006) é um divisor de águas no gênero.

Além de ser o filme mais engraçado desde sei lá quando, Borat tem um roteiro inteligente e sua própria concepção é hilariante. Borat Sagdiyev (Sacha Baron Cohen) é um repórter do Cazaquistão que vai aos EUA para filmar um documentário capaz de... atualizar a cultura de seu país. Só que a América visitada por Borat não é tão diferente assim de seu pequeno e glorioso Cazaquistão. É uma alfinetada no significado de globalização (americanização?). Diferente de outras comédias, o alvo do filme não é o “politicamente incorreto”, mas o ataque à “incorreção política”.

Em toda a história do cinema, nunca houve um filme tão direto na crítica à política e à sociedade americana. Borat destrói valores do american way of life e dispara contra mulheres, minorias e deficientes físicos. Ele não consegue esconder a surpresa ao descobrir como tais grupos são respeitados nos EUA. Ainda assim, a grande polêmica está no ódio do repórter pelos judeus.

O segredo do filme está na inocência do personagem criado pelo comediante inglês de origem judaica Sacha Baron Cohen – um homem que desconhecia a cultura fora do Cazaquistão (mesmo que não seja verdade o que acontece por lá). Cohen, em parceria com o diretor Larry Charles e o produtor Jay Roach criticam o modo como os americanos enxergam os estrangeiros e (pior) seu próprio povo. Ironicamente, ninguém foi para a cadeia e Borat virou um ícone da cultura pop. Sem entregar as cenas, basta dizer que você vai chorar de rir mesmo não aprovando o humor grosseiro. Nem que seja na famosa seqüência da luta no quarto do hotel.

O fascínio também reside na tentativa de decifrar o que é verdade ou não em Borat. Muita gente em cena foi enganada ao achar que realmente estava sendo entrevistada por um repórter do Cazaquistão. A busca de Borat pela amada Pamela Anderson é o principal elemento encontrado pelos roteiristas (Cohen é um deles) para confundir o público nessa percepção. A idéia está naquela velha história: “perco o amigo, mas não perco a piada”. Nada mais será como antes deste filme. Very nice!

Borat – O Segundo Melhor Repórter do Glorioso País Cazaquistão Viaja à América

(Borat – Cultural Learnings of America for Make Benefit Glorious Nation of Kazakhstan, 2006)
Direção: Larry Charles
Roteiro: Sacha Baron Cohen, Anthony Hines, Peter Baynham e Dan Mazer
Elenco: Sacha Baron Cohen, Ken Davitian, Luenell e Pamela Anderson

sexta-feira, fevereiro 16, 2007

Cartas de Iwo Jima

A Conquista da Honra é um filmaço, mas Cartas de Iwo Jima (Letters From Iwo Jima, 2006) é uma obra-prima profunda e verdadeira. Esse é o 27º filme de Clint Eastwood como diretor e o melhor de sua carreira.

Há uma tristeza amarga em Cartas de Iwo Jima, mas nunca evidente. É a história do lado derrotado em uma das batalhas mais sangrentas da Segunda Guerra Mundial. Cerca de 22 mil japoneses resistiram ao ataque de aproximadamente 100 mil americanos. A salvação dos soldados pode estar na figura paterna do General Kuribayashi (o extraordinário Ken Watanabe). Mais uma vez, Clint aposta na importância dos filhos para cessar a violência. Quando não há mais saída, a cultura de guerra japonesa solicita o harakiri – um ritual de suicídio e código de honra entre os samurais. Kuribayashi viveu um período de sua vida nos EUA. Ele conhece e admira os americanos, o que gera a antipatia de alguns oficiais japoneses. Por ter uma noção do inimigo, Kuribayashi respeita o harakiri, mas pede para que seus homens lutem até a morte para que o sacrifício não seja em vão. Acredite: você pode não aprovar o harakiri, mas vai respeitar a atitude dos japoneses no filme. É o conflito da honra. Como ótimo contador de histórias, Clint fez a mesma coisa em Menina de Ouro (2004), quando tocou de forma delicada no polêmico tema da eutanásia.

Pode-se dizer também que Cartas de Iwo Jima é uma homenagem de Clint ao cinema japonês, principalmente a Akira Kurosawa. Mas antes de tudo é uma leitura sobre a compreensão do inimigo, algo presente na segunda fase do cinema de John Ford. A coragem do diretor reside na câmera atuando como os olhos do exército japonês. Sempre vistos como inimigos impiedosos e sem alma, eles têm a mesma opinião sobre os americanos. A guerra em Cartas de Iwo Jima não é espetacular. Ela é íntima. Os túneis de Clint Eastwood simbolizam o interior humano. O pior medo está na cabeça e no coração dos homens. Talvez, o que aconteça neste reino (os túneis) seja pior do que ocorre lá fora, ou seja, a guerra propriamente dita contra o inimigo. A violência contra o lado desconhecido surge, primeiramente, do ponto em que o ser humano não se conhece inteiramente. Então, como pode compreender o outro? Há algo dessa idéia no personagem Ethan Edwards (John Wayne), de Rastros de Ódio (1956), o clássico de John Ford – ídolo de incontáveis diretores, inclusive de Akira Kurosawa.

Em uma cena particularmente tocante, um oficial japonês lê uma carta que estava no bolso de um prisioneiro ianque. É de sua mãe. Todos os soldados japoneses ficam comovidos e um deles diz algo assim: “Pensei que eles eram selvagens. Mas a mãe dele não pode ser tão diferente da minha”. Mais tarde, esse soldado japonês é capturado por um pelotão americano e assassinado a sangue frio. Como segmento de A Conquista da Honra, essa parte de Cartas de Iwo Jima se torna ainda mais poderosa. É o reconhecimento de cada um dos lados mostrado de forma sublime e a conclusão definitiva do cinema de que todos saem derrotados em uma guerra.

Cartas de Iwo Jima (Letters From Iwo Jima, 2006)
Direção: Clint Eastwood
Elenco: Ken Watanabe, Kazunari Ninomiya, Tsuyoshi Ihara, Ryo Kase e Shido Nakamura

quinta-feira, fevereiro 15, 2007

Dreamgirls

A Academia não engoliu Dreamgirls – Em Busca de um Sonho (Dreamgirls, 2006). O filme mais celebrado antes das indicações ficou de fora das categorias principais, embora dispute oito Oscar, incluindo Melhor Atriz Coadjuvante (Jennifer Hudson) e Melhor Ator Coadjuvante (Eddie Murphy). Mas quer saber? A Academia não deve ser levada a sério, porém acertou. Dreamgirls é uma enganação de profundo mau gosto cinematográfico. Não estou falando do repertório de soul e rhythim & blues, mas de cinema mesmo.

Tenho problemas com musicais. Não consigo entender muito a dramaticidade do gênero ao ver um “diálogo cantado”. Acho que o gênero é produto de uma época glamourosa de Hollywood, que não volta mais. Estúdios, produtores e diretores pensavam diferente e havia um grupo de atores como Gene Kelly, Fred Astaire e Julie Andrews – só para citar alguns – que nasceram para isso. Tudo fazia sentido nessa celebração da música, afinal era o auge da Hollywood sonora. Não me entendam mal: acho que a época gerou clássicos absolutos, irretocáveis como Cantando na Chuva (1952), Mary Poppins (1964) e A Noviça Rebelde (1965), que estão entre os meus favoritos de todos os tempos – um pouco abaixo, coloco Amor, Sublime Amor (1961).

Depois que Steven Spielberg e George Lucas lançaram, respectivamente, Tubarão (1975) e Star Wars (1977), Hollywood cansou dos musicais. Ficou claro que o público estava pronto para outras maravilhas sonoras dentro de uma sala de cinema. Bob Fosse ainda resistiu e deu ao gênero os seus últimos suspiros com os ótimos Cabaret (1972) e All That Jazz (1979). Mas já havia ali um estilo diferente (ou fúnebre) dos musicais de palco – o outro lado de um gênero marcado pela alegria. Seria o fim desses espetáculos na tela do cinema?

Hoje, não há mais aquele “ator de musicais”. Não existe? Ou Hollywood não quer descobrir talentos? Também não há mais um “diretor de musicais”. Por muito tempo, a palavra “musical” no cinema ficou restrita a animações da Disney. A volta do gênero, com atores de carne e osso, soa como oportunismo no meio da falta de idéias dos estúdios. Se é para trazer o musical de volta, que seja algo extraordinário. Fora de Hollywood, Lars Von Trier fez um teste com Dançando no Escuro (2000). Ele não queria resgatar nada, mas sim avacalhar o gênero com seu cinema depressivo. Entre os grandes estúdios, Baz Luhrmann chegou perto com Moulin Rouge (2001), mas sua insistência em montar um filme como videoclipe irritou muita gente. Na mesma proporção, a produção também tem seus fãs: a força de Moulin Rouge está no apelo romântico da dupla Ewan McGregor e Nicole Kidman, que disparam belas canções atuais em um filme de época. Não é nem de longe ruim. Mas poderia ser melhor. Isso foi o suficiente para Hollywood apostar no gênero e veio aquele Chicago (2002), um dos piores vencedores do Oscar de Melhor Filme. Antes de todos esses, quem chegou mais perto de reviver o gênero foi Woody Allen, com Todos Dizem Eu te Amo (1996). Na verdade, ele não tinha essa pretensão, o que tornou o filme delicioso. Trata-se apenas de uma homenagem. Nada mais.

A pretensão pode ser uma armadilha. O que nos leva a Dreamgirls. O diretor Bill Condon realizou o sonho de levar o musical da Broadway (inspirado na carreira das Supremes) para as telas, mas é filme para americano vibrar. Ou exclusivamente para fãs de soul e r&b. Se você não adora esse tipo de música, melhor passar longe de Dreamgirls. Condon até esconde o fiapo de história ao dar um ritmo ágil e contagiante ao filme – a montagem faz mágica no cinema. O diretor quis discutir os excessos da indústria fonográfica e como o poder corrompe e destrói laços. Mas tudo acontece tão rápido e de forma superficial, que fica difícil acreditar na decisão de alguns personagens. É um exemplar do gênero que vem nessa nova tendência da máquina de Hollywood. Parece aquele presente com uma embalagem de encher os olhos, só que o conteúdo não tem tanto valor. Ou seja, Dreamgirls é soul, mas sem alma.

A salvação do filme está no elenco. Mas como cantores – não exatamente atores (tirando Beyoncé, que não é uma coisa, nem outra). Os prêmios para Eddie Murphy só podem ser exageros. Sua atuação se resume em vibrantes performances nos palcos inspiradas em James Brown. Murphy sempre foi talentoso e é um ótimo imitador. Mas por Dreamgirls, ele merece um Grammy. Não um Oscar.

É um caso que não se aplica a Jennifer Hudson. Ela é mesmo um achado. Jennifer canta demais e se destaca do restante do elenco ao transmitir seus dotes dramáticos em cenas musicais. De qualquer forma, fico preocupado com a continuidade de sua carreira. A atriz não tem o perfil das grandes estrelas e pode ficar restrita aos musicais (ou pode seguir em frente como cantora). Quem sabe? Será que nasce, enfim, uma nova estrela de musicais? Há males que vêm para o bem.


Dreamgirls - Em Busca de um Sonho (Dreamgirls, 2006)
Direção: Bill Condon
Elenco: Jennifer Hudson, Beyoncé Knowles, Jamie Foxx, Eddie Murphy e Danny Glover

terça-feira, fevereiro 13, 2007

O Diretor da Década

Independente do que faça daqui para frente, Clint Eastwood já tem seu lugar garantido entre os grandes nomes do cinema. Depois de Sobre Meninos e Lobos (2003), Menina de Ouro (2004), A Conquista da Honra (2006) e Cartas de Iwo Jima (2006), seria exagero apontar Clint como o diretor da década? Embora ainda faltem alguns anos, esses quatro trabalhos têm tudo para figurar na lista de críticos e cinéfilos para os melhores filmes de 2001 a 2010.

Claro que outros diretores sacudiram essa década. É o caso de Martin Scorsese, que com Gangues de Nova York (2002), O Aviador (2004) e, principalmente, Os Infiltrados (2006), voltou a colocar o seu nome no topo de Hollywood. Steven Spielberg também fez bonito com A.I. – Inteligência Artificial (2001), Prenda-Me Se For Capaz (2002) e Munique (2005). Mas tanto Spielberg quanto Scorsese já viveram décadas mais proveitosas – como as de 70 e 80 (e 90, no caso de Spielberg). Vale citar Peter Jackson, que talvez tenha feito a produção da década com a trilogia O Senhor dos Anéis (2001/2002/2003), o maior símbolo do cinemão de Hollywood. Jackson também caprichou na refilmagem de King Kong (2005), um dos melhores remakes da história. Mas como será a sua carreira depois dessas extraordinárias aventuras? Talvez ele ainda possa fazer mais e mais. E melhor. Quem sabe?

Já Clint Eastwood é uma lenda viva do cinema. Desde os tempos de ator durão de faroestes como Três Homens em Conflito (1966), de Sergio Leone, ao policial Dirty Harry (1971), de Don Siegel, Clint era adorado pelo público. Ainda assim, naquela época, a crítica teimava em chamá-lo de “canastrão”. O respeito começou com a estréia na direção em Perversa Paixão (1971) – logo depois de uma elogiada atuação em O Estranho que Nós Amamos (1971), de Don Siegel. A verdade é que Clint aprendeu tudo o que precisava para ser um bom cineasta com Leone e Siegel.

Para Clint, o diretor tem que ser muito ruim para estragar tudo. Ele acha que filmes de qualidade saem da colaboração entre ótimos roteiros, atores e, claro, uma precisão cirúrgica na sala de edição. Preocupado com as trilhas de seus filmes e fã assumido de jazz, Clint fez de Bird (1988), um dos grandes filmes sobre personalidades marcantes da música. Por esse trabalho, Clint ganhou o Globo de Ouro de Melhor Diretor e conquistou a crítica de vez. Hoje, ele tem segurança total de seu ofício como ator, produtor, diretor e... compositor de trilhas sonoras. E que trilhas!

Sempre interessado em discutir os dilemas morais de personagens tentando sobreviver em um mundo de violência (física ou mental), Clint aposta a salvação de seus heróis sofredores na importância dos filhos. Na verdade, são conceitos explorados em seus melhores trabalhos por trás das câmeras. Foi assim com Os Imperdoáveis (1992), que lhe rendeu seus primeiros Oscar de Filme e Direção, Um Mundo Perfeito (1993), belíssimo drama subestimado com Kevin Costner, e As Pontes de Madison (1995). Até 2003, Clint se preocupou em realizar produções mais comerciais, que chegavam até a agradar, mas não estavam à altura de sua filmografia. Parece que Clint estava juntando dinheiro para nunca mais se preocupar com os retornos financeiros de seus filmes. Sobre Meninos e Lobos (2003) surgiu como uma carta na manga. Indicado a seis Oscar, o filme levou as estatuetas de Melhor Ator (Sean Penn) e Melhor Ator Coadjuvante (Tim Robbins) – só não ganhou novamente os Oscar de Filme e Direção porque foi o ano da consagração de O Senhor dos Anéis. Nada que não pudesse ser corrigido no ano seguinte com Menina de Ouro (2004). Foram quatro Oscar, incluindo Melhor Filme e Diretor, além de uma indicação como Melhor Ator para o velho Clint. Agora, com Cartas de Iwo Jima (2006), ele emplacou mais quatro indicações da Academia. Trata-se de um filme de suma importância por abordar (com muita delicadeza) a visão japonesa de uma das batalhas mais sangrentas da Segunda Guerra Mundial – Clint foi ousado e corajoso como nenhum outro cineasta americano em muito tempo. Mas isso é assunto para um próximo post.

Aos 76 anos, ele enche os olhos dos cinéfilos nesta década. Que outro cineasta abordou, em sua filmografia, alguns mitos ou heróis americanos (ou de meninos) como cowboys (Os Imperdoáveis), astronautas (Cowboys do Espaço), policiais (Dirty Harry) e soldados (A Conquista da Honra)? Não é para qualquer um. Spielberg chegou a dizer que Clint é um exemplo, afinal consegue fazer seus melhores filmes depois dos 70 anos. Para Clint, isso é simples. Ele diz que ainda não parou de aprender.

Os Prêmios dos Roteiristas

No último domingo, o Sindicato dos Roteiristas de Hollywood (Writers Guild of America - WGA) definiu os favoritos ao Oscar de Melhor Roteiro (Original e Adaptado). Ano passado, Crash e O Segredo de Brokeback Mountain ganharam, respectivamente, nessas categorias e também levaram o Oscar.

Concorrendo com Babel, A Rainha, Mais Estranho que a Ficção e Vôo United 93, Michael Arndt ganhou o WGA de Melhor Roteiro Original, por Pequena Miss Sunshine. Neste final de semana, o BAFTA (o Oscar inglês) também premiou o roteiro do filme. Juntando esses prêmios às escolhas de outros sindicatos, a comédia de Jonathan Dayton e Valerie Faris vai com mais força para a festa do dia 25 de fevereiro. Mas existe um detalhe que deve ser considerado: há tempos que o vencedor de Melhor Roteiro no Globo de Ouro repete o feito no Oscar – A Rainha, então, coloca o script de Peter Morgan como principal rival de Pequena Miss Sunshine nesta categoria.

Com menos concorrentes ameaçadores, William Monahan ganhou o WGA de Melhor Roteiro Adaptado, por Os Infiltrados. Favorito como Melhor Diretor no Oscar, o filme de Scorsese pode levar mais essa para casa. Os Infiltrados concorreu no WGA com Borat – O Segundo Melhor Repórter do Glorioso País Cazaquistão Viaja à América, O Diabo Veste Prada, Pecados Íntimos e Obrigado Por Fumar.

segunda-feira, fevereiro 12, 2007

Grey’s Anatomy – 3ª Temporada

Grey’s Anatomy estreou no mid-season em 2005, tapando um buraco na programação da ABC. Caiu imediatamente no gosto do público e consagrou-se como um mega sucesso com a excelente segunda temporada, que ganhou o Globo de Ouro de Melhor Série Dramática.

Exibida no Brasil pelo canal Sony, às segundas-feiras, a terceira temporada vem carregada de expectativa, como o segundo disco de uma banda de sucesso: a hora da verdade.

À primeira vista, a série parece mais um drama médico, mas o Seattle Grace Hospital funciona quase como um pano de fundo para os dramas pessoais de médicos e pacientes. Os personagens são complexos e não há vilões ou mocinhos definidos. É impossível não se identificar com alguém, ou alguma situação. A protagonista, Meredith Grey (Ellen Pompeo), que empresta o sobrenome à série, está longe de ser uma heroína tradicional: ela é insegura, confusa... um tanto promíscua. E por isso mesmo, adoravelmente carismática.

O elenco é excelente – com destaque para Chandra Wilson (Miranda Bailey), Katherine Heigl (Izzie Stevens) e Sandra Oh (Cristina Yang). Outro ponto alto é a trilha sonora recheada de boas canções de novos artistas. A importância da música para a série fica evidente nos títulos dos episódios – inspirados em nomes de canções.

Mas para quem acompanhou as idas e vindas de Meredith e McDreamy (Patrick Dempsey), o drama de Izzie e Denny (Jeffrey Dean Morgan), além das limitações emocionais de Cristina na segunda temporada, os primeiros episódios da terceira podem trazer uma ponta de decepção. Não que sejam ruins, apenas não tão bons quanto se esperava. A criadora e roteirista da série, Shonda Rhimes, usa e abusa de clichês de novelas, que chegam a irritar.

Ainda assim, o primeiro episódio – exibido na semana passada pelo Sony – tem bons momentos. O luto de Izzie, ainda vestida de princesa, deitada no chão, imóvel, tentando digerir os acontecimentos é até emocionante. Assim como a cena em que a Dra. Bailey consola um paciente que perdeu a esposa – e a si mesma por ter perdido Denny. Os flashbacks também se encaixam bem ao episódio.

Felizmente, os clichês de novela desaparecem do sexto episódio em diante e a série retoma o ritmo normal e contagiante. Quem é fã, sabe que isso significa boas risadas, muitas lágrimas e mais uma temporada deliciosamente viciante. Seriously.



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sexta-feira, fevereiro 09, 2007

Rocky Balboa

Mesmo sendo fã da série iniciada em 1976, eu não assistia a qualquer um dos cinco filmes há cerca de dez anos. Achei que a sensação de nostalgia proposta por Sylvester Stallone para o novo Rocky Balboa (2006) ia gerar boas risadas. Mas, felizmente, o ator, roteirista e diretor voltou em grande forma. Em tempos de Menina de Ouro (2004), de Clint Eastwood, Stallone entendeu que o mundo não é o mesmo de 30 anos atrás e entregou uma produção emocionante para os fãs. Rocky Balboa merece elogios, principalmente pelo esforço evidente do diretor em diminuir os exageros dos clichês, que deram à série um sinônimo de piada.

O desrespeito pelos cinco filmes foi consolidado pelas seqüências da produção original. As continuações perderam a essência dramática que movia o lutador no vencedor do Oscar de 1977 para realçar uma postura muito mais fantástica no personagem. Embora sejam filmes divertidos, havia pouco da obra original criada pelo astro. Rocky II, III, IV e V focavam nas lutas. Não em Balboa. Mas o sexto e último da série, além do peso dessa falta de respeito ao personagem, trazia outro problema: os 60 anos de Sylvester Stallone. Como fazer Rocky subir no ringue de forma convincente com essa idade?

Em Rocky Balboa, os americanos ainda amam o boxe, mas não admiram o campeão atual, Mason Dixon (Antonio Tarver). Ainda invicto, ele é um lutador frio, calculista, dono de carisma zero e seus empresários constatam que não há mais ninguém interessado em enfrentá-lo. A imprensa acha que Dixon não lutou contra um adversário à sua altura – assim como Michael Schumacher na Fórmula 1. Stallone acerta em caracterizar Rocky como um homem preso no passado, que sofre com a morte repentina da amada esposa, Adrian (Talia Shire, que não participa do filme), e o relacionamento problemático com o filho (Milo Ventimiglia, de Heroes). O ex-campeão administra um restaurante onde passa horas divertindo seus clientes com histórias de suas lutas. Seu cunhado Paulie (Burt Young) e uma nova amiga, Marie (Geraldine Hughes), tentam ajudá-lo a encontrar um novo sentido para a vida. Tudo muda quando a ESPN simula uma luta por computador de Balboa contra Dixon e o primeiro sai como vencedor. Lógico que os empresários inescrupulosos aproveitam a oportunidade para convencer o Rocky de verdade a participar de um combate de exibição. Quem vencerá? Quem é o melhor? Para Stallone, são questões que não importam mais.

Rocky Balboa é emocional e quase esbarra na pieguice, mas acerta ao aproximá-lo do filme original, que apostava no personagem. Além disso, ele atualiza a série ao circular por um lema pouco valorizado pelos americanos: “O importante é competir”. Essa é a idéia que traz Rocky de volta à vida. Sentindo-se capaz de subir no ringue – mesmo com 60 anos nas costas –, Balboa reencontra o amor e a esperança naquilo que mais gosta de fazer. Uma atitude que conquista o respeito do filho e faz o público gritar seu nome mais uma vez. Ou seja, tanto faz ganhar ou perder. A questão é inédita na série e move parte da indústria cinematográfica em uma análise diferenciada da América graças à tirania de George W. Bush. Rocky Balboa se encaixa nesses padrões que dominaram até a Academia nos filmes indicados ao Oscar no ano passado. Se Rocky pode mudar, a América também é capaz?


Não é o filme dos sonhos e Stallone não vai ameaçar o legado de Clint Eastwood entre os diretores. Mas seu esforço é louvável ao tentar agradar fãs e dar novos contornos políticos para a saga. Desafio quem gosta da série a não ficar emocionado quando ouvir a clássica trilha de Bill Conti ou observar Rocky subir novamente aquela velha escadaria.

Rocky Balboa (2006)
Direção: Sylvester Stallone
Elenco: Sylvester Stallone, Burt Young, Milo Ventimiglia, Tony Burton, Antonio Tarver e Geraldine Hughes

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quinta-feira, fevereiro 08, 2007

A Rainha

A cena inicial de A Rainha (The Queen, 2006) precisa estar na aula de qualquer professor de cinema. O diretor Stephen Frears foca a TV exibindo imagens de um confiante Tony Blair (Michael Sheen) votando nas eleições de Primeiro-Ministro. O corte revela a Rainha Elizabeth II (Helen Mirren) cética como telespectadora em um plano maior. Em mais um corte, ela comenta a situação com um homem que pinta o seu quadro. O cidadão revela não ter votado em Blair, o que deixa a Rainha contente. Até a magistral cena de um “quadro vivo”, que mostra o título do filme, Frears quer dizer que esse é um filme para humanizar a imagem de Elizabeth II – uma mulher forte exercendo seu poder de forma discreta e longe de qualquer sensacionalismo dos meios de comunicação.

Na época, a Inglaterra se libertava de Margaret Thatcher e Tony Blair era visto como um símbolo de esperança e modernidade. O ótimo ator Michael Sheen (esquecido no Oscar) empresta uma caracterização ainda inocente para o Primeiro-Ministro que acaba de chegar ao poder. Blair sabe que a monarquia é coisa do passado e precisa evoluir. Reservada, a Rainha não vê essa filosofia com bons olhos e se dirige ao político com um certo ar de superioridade. E é o famoso acidente responsável pela morte da adorada Lady Di, que chega como a oportunidade perfeita para Blair conquistar o povo.

A Rainha acha que a princesa divorciada não é mais integrante da Família Real e sugere um funeral particular. Blair pensa na ocasião como um evento para a Inglaterra e o povo deve participar do funeral. Um excepcional choque de tradições é orquestrado não somente pela câmera elegante de Stephen Frears, mas por um roteiro quase visível na tela escrito por Peter Morgan. Quase todas as cenas são internas e Morgan disseca os bastidores da monarquia abalada pelas conseqüências da morte da “Princesa do Povo”. Enquanto vemos o círculo da Rainha se fechar diante de família e empregados (somente a Rainha Mãe e o Príncipe Philip podem apoiá-la), as influências de Blair se abrem - dentro de casa como um homem comum, ele recebe conselhos da esposa, e na vida profissional, seus assessores organizam a derrocada da monarquia. Mas Blair não vê assim. Ele acha que a Rainha pode ceder pacificamente e fazer uma aparição pública para lamentar a morte de Diana. Em termos de tradição, a Rainha está certa em não aceitar, mas em tempos de celebridades, ela está errada. Observando tudo isso, está Stephen Frears perguntando ao público: “O que são valores? E o que significa progresso?”

Nada disso seria intrigante sem a atuação da Dama Helen Mirren. Ela está maravilhosa em sua composição física da Rainha. Há uma belíssima cena na montanha, quando o carro de Elizabeth II quebra. Esperando por ajuda, ela chora e sente que é capaz de rever seus conceitos. Nesse breve momento, sabemos que Helen Mirren também trabalhou o interior da personagem. Não se trata apenas de uma imitação. É um trabalho extraordinário que figura entre as maiores atuações do cinema.

Helen Mirren mostra que a Rainha é uma mãe para a Inglaterra. Ela se preocupa com o sol batendo no pátio do palácio e lamenta a morte de um animal. Isso é preocupação com a "terra". É uma mulher de princípios carregando um fardo que, por mais que não seja seu sonho de vida, ela cumpre com muita seriedade. Mas antes de tudo, ela é mãe. Primeiro do filho e dos netos, depois da Inglaterra.


Blair é mais político e se julga modernista. Ele é uma celebridade, mas suas atitudes podem levar o povo a reconhecer a Rainha. Stephen Frears permite um retrato de Blair como um homem ainda inocente e capaz de admirar a Rainha. Apesar de tudo, Elizabeth II lhe dá uma lição na bela seqüência final, que acompanha os dois organizando planos para o futuro do país. Ela pede para que Blair aproveite a popularidade. O filme é uma homenagem a Elizabeth II, mas também olha com ironia para o início do mandato de Blair. Todos nós sabemos onde isso foi parar.

A Rainha (The Queen, 2006)
Direção: Stephen Frears
Elenco: Helen Mirren, Michael Sheen e James Cromwell

terça-feira, fevereiro 06, 2007

Pecados Íntimos

Há algo de Beleza Americana (1999) ou Desperate Housewives no novo filme de Todd Field, de Entre Quatro Paredes (2001). O tom tragicômico dessas referências é usado aqui ao extremo. Pecados Íntimos (Little Children, 2006) é muito mais forte e sugere uma ousadia na presença de um narrador (em off) dotado de afiada ironia como não se vê desde Barry Lyndon (1975), de Stanley Kubrick (lógico que a comparação com o clássico pára aqui).

Como se estivesse lendo um livro, o narrador situa o filme em uma vizinhança aparentemente normal. O fio condutor é Sarah (cortesia da extraordinária Kate Winslet), uma insatisfeita dona de casa que parece não ter se adaptado como mãe. Há um arrependimento evidente em seu olhar que denuncia uma vida interrompida pelo casamento infeliz. Sarah é especialista em letras, mas passa o dia cuidando da filha e esperando o marido voltar do trabalho. Ela conhece Brad (Patrick Wilson, de Menina Má.Com), um pai ocupado com os afazeres domésticos, incluindo os cuidados com o filho. Sustentado por uma mulher linda e bem-sucedida (Jennifer Connelly), Brad também é um fracassado na vida profissional e os caminhos desses desiludidos se cruzam no parquinho preferido das crianças das redondezas. Apesar das semelhanças, Sarah tem mais coragem para melhorar sua rotina, enquanto Brad é mais impulsivo (infantil?). Como uma moderna Madame Bovary, ela se entrega de corpo e alma ao inevitável caso, enquanto ele se interessa apenas por uma “aventura” (chegando até mesmo a considerar a esposa mais bonita do que Sarah).

Mas há um personagem em Pecados Íntimos que conecta todos os outros para justificar o título original do filme: Ronnie (Jackie Earle Haley) acabou de sair da prisão por crime de pedofilia. A vizinhança se desespera com seu retorno à “vida normal e pacata” da região. O homem chamado de monstro não tem direito a uma segunda chance? É uma questão que divide os outros personagens – quase todos são pais e o nascimento de seus filhos representa uma fuga do marasmo. Será que o destino de todos pode ser o mesmo da mãe de Ronnie, que criou o filho debaixo da saia até o fim da vida? Esse é o ponto interessante de Pecados Íntimos: Ronnie ainda é uma criança e convive com a sombra da mãe. Talvez, seu crime atroz seja justificado pela recusa do personagem em não crescer. Mas se olharmos bem, todos os outros, incluindo Sarah e, principalmente, Brad, são crianças em corpos de adultos. Enquanto ela tenta se libertar dessa condição, ele continua com dúvidas se quer mesmo deixar sua “criancice” de lado. Ou seja, o filme captura o espectador nessa análise de uma sociedade que nunca será completamente madura.

As atuações de Jackie Earle Haley e Kate Winslet garantem a força do filme. Aliás, Haley tem uma cena nervosa que fica na memória: sua entrada na piscina. Mas quase tudo desanda no final com alguns exageros de Todd Field, principalmente em suas conclusões nas atitudes de Brad. Há uma falsa moralidade criticada pelo diretor no final. É uma opção que dá um caráter derrotista ao filme – parece que Pecados Íntimos acaba indo do nada a lugar nenhum. Exatamente no mesmo ponto onde acho que Beleza Americana compromete sua excelência. Só que o vencedor do Oscar carrega nas emoções em seu final para disfarçar isso. Todd Field é mais seco em Pecados Íntimos. Até entendo que, para mudar, seus personagens precisam se conhecer por dentro antes de tudo. Mas fica uma sensação de culpa em seus atos, que precisa ser punida. Será que o diretor perdeu a fé na história? Ou ele também é uma “criança” com medo do mundo?

Pecados Íntimos (Little Children, 2006)
Direção: Todd Field
Elenco: Kate Winslet, Patrick Wilson, Jackie Earle Haley, Jennifer Connelly e Noah Emmerich

segunda-feira, fevereiro 05, 2007

Diretores reconhecem Martin Scorsese

Finalmente, o mestre Martin Scorsese ganhou o devido (e tardio) reconhecimento dos colegas de profissão. No último sábado, o Sindicato dos Diretores (Directors Guild Awards - DGA) premiou o cineasta responsável por clássicos modernos como Taxi Driver (1976), Touro Indomável (1980) e Os Bons Companheiros (1990). Depois de seis derrotas, Scorsese ganhou o DGA por outra maravilha que ficará para a história do cinema: Os Infiltrados.

Alejandro González Iñárritu (Babel), Stephen Frears (A Rainha) – ambos indicados ao Oscar –, Bill Condon (Dreamgirls) e o casal Jonathan Dayton e Valerie Faris (Pequena Miss Sunshine) concorreram com Scorsese. O prêmio deixa o cineasta ainda mais perto de ganhar seu primeiro Oscar de Melhor Diretor – em quase 60 anos, apenas seis vencedores do DGA não repetiram o feito no Oscar. Leia: essa é a melhor chance de Scorsese levar o careca dourado em toda a sua carreira.

“Eu só quis fazer um bom filme que as pessoas gostassem. Só isso. Admito que não pensei que estaria aqui nesta noite.”, declarou Scorsese em seu discurso de agradecimento. Chega a ser irônico, afinal o próprio estúdio, ao divulgar Os Infiltrados fez um pedido à imprensa para não rotular o filme de “provável candidato ao Oscar” para “não ferir os sentimentos de Scorsese”. É até uma preocupação relevante – não há razões para o velhinho sair de sua casa pela sexta vez para ouvir outro nome na hora do “And the Oscar goes to...”. Sei não, mas parece que agora vai.

domingo, fevereiro 04, 2007

À Procura da Felicidade

À Procura da Felicidade (The Pursuit of Happyness, 2006) é um filme difícil de odiar e fácil de amar. É uma daquelas raras produções com capacidade para levar gente que nem vai tanto ao cinema para a sala escura mais próxima de casa. Mesmo na era da Internet, esse tem tudo para ser aquele filme que as pessoas comentam e divulgam no escritório ou na escola: "Nossa! Você viu? Tem que ver! Dá vontade de chorar!" e por aí vai...

E sim! À Procura da Felicidade é filme para chorar. E muito! Não que o bom diretor italiano Gabriele Muccino, de L'Ultimo Bacio (2001), carregue na pieguice, mas é quase impossível não sofrer junto com as desgraças na vida de Chris Gardner (um grande momento de Will Smith, indicado ao Oscar de Melhor Ator). E põe desgraça nisso! Se as coisas podem piorar, elas realmente acontecem nessa história.

Em plena era Reagan, de nada adiantou para Chris Gardner ser inteligentíssimo na escola, afinal ele não consegue um emprego fixo e vive como um pobre coitado afundado em dívidas. Gardner apostou tudo nas vendas de um scanner de ossos, mas ao bater de hospital em hospital, ele descobre que os médicos não compartilham de seu entusiasmo com o produto. Sua única alegria e motivação é o filho de cinco anos (Jaden Christopher Syre Smith, filho do próprio ator). Por ele, Chris Gardner jamais desiste de lutar por uma condição melhor, apesar de lidar diariamente com a esposa insatisfeita (e ingrata, vai). Como disse, tudo vai mal, mas as coisas conseguem piorar ainda mais.

Há uma sucessão incrível de desilusões em sua vida - chega até a dar raiva certa hora (eu me contorcia na cadeira do cinema), mas o diretor Gabriele Muccino nasceu para fazer um dramalhão. A música do filme é bem bonita, mas ele não se aproveita dela para fazer o público se emocionar - é um mérito do diretor como contador de histórias. É tudo muito sincero: você sente na pele o que acontece com Chris Gardner e seu filho. A emoção vem do sofrimento intenso e cruel sem apelações.
O mais impressionante é o filme ser baseado em uma história real. Sabendo disso, podemos até dizer que dinheiro não traz felicidade, mas graças ao carisma de Will Smith, ao belo roteiro de Steve Conrad e a direção de Muccino somos levados a crer que ninguém merece mais uma boa grana do que esse Chris Gardner. É o poder do cinema. Em tempos menos cínicos, esse seria um grande favorito ao Oscar. Concordando ou não com a Academia.

Pode não ser um filme perfeito, mas À Procura da Felicidade agrada por reviver um tipo de drama competente que se fazia nos anos 70 (ou na virada dos 80), como o de tema semelhante, mas não igual, Kramer Vs. Kramer (1979). Há até um certo diálogo com Capra ou a loucura de Roberto Benigni em A Vida é Bela (1998) - quando um pai tenta amenizar a terrível realidade ao seu filho. Mas são apenas lembranças de filmes que conhecemos e gostamos. À Procura da Felicidade segue com identidade própria e difere desses títulos ao carregar na tristeza e na amargura. Ficamos até o final pensando: "Será que vai acontecer algo de bom na vida deles?". Pode levar a caixa de lenços para o cinema.

À Procura da Felicidade
(The Pursuit of Happyness, 2006)
Direção: Gabriele Muccino
Elenco: Will Smith, Jaden Christopher Syre Smith, Thandie Newton e Brian Howe

quinta-feira, fevereiro 01, 2007

A Conquista da Honra

Na primeira cena de A Conquista da Honra (Flags of our Fathers, 2006), um soldado corre pelo campo de batalha devastado e procura desesperadamente por alguém. Mas quem é essa pessoa? A questão respondida somente no final transforma A Conquista da Honra em mais do que uma homenagem aos soldados que ergueram a bandeira americana em Iwo Jima durante a Segunda Guerra Mundial. É um toque metalingüístico e sublime (não posso revelar) que dá outro sentido ao filme em uma revisão.

Inicialmente, Eastwood narra as conseqüências nas vidas de três soldados que estavam na famosa foto de Joe Rosenthal – eram seis, mas três deles morreram logo depois do registro da imagem. O cineasta parte de um ponto intrigante: não dá para ver os rostos dos soldados na foto. John Bradley (Ryan Phillippe), Ira Hayes (Adam Beach) e Rene Gagnon (Jesse Bradford) retornam aos EUA transformados em heróis pelo governo. Para o trio, trata-se de uma farsa e cada um sofre o peso de forma distinta. Para o presidente Harry Truman, essa é a oportunidade certa para comover o público e arrecadar fundos para a guerra. O filme se concentra mais nestes conflitos internos dos soldados do que na ilha de Iwo Jima.

A partir do roteiro de Paul Haggis e William Broyles Jr., Eastwood consegue ligar idas e vindas no tempo com maestria – sem nenhum exagero ou mecanismo para juntar as histórias (como já virou moda). Além de produzir e dirigir A Conquista da Honra, Clint compõe a trilha. É uma música belíssima, emocionante e que fica na cabeça por um bom tempo. Aos 76 anos, sua determinação é invejável. Sempre econômico, Clint não se deixa seduzir pela grandiosidade do tema, mas não decepciona nas ferozes cenas de batalha. O que é aquela visão do piloto de dentro do avião? Que detalhe magnífico! Mas é nas cenas mais intimistas, que Clint emociona de verdade e sem esbarrar em pieguices. Nenhuma lágrima é calculada em A Conquista da Honra. Mas é quase inevitável segurá-las. Seguindo a ordem dos mestres da Hollywood clássica, Clint sabe que não precisa mostrar muito para deixar o público perplexo – como na cena do soldado, que descobre o corpo do amigo dentro de uma caverna escura. Com seu rosto coberto de sombras, não sabemos se sua expressão é de raiva ou se ele chora.

Em A Conquista da Honra, Eastwood expõe as influências de seus mestres Sergio Leone e Don Siegel como não vemos desde Os Imperdoáveis. O conceito dos “heróis” idolatrados pela nação carrega uma ironia também vista em Os Eleitos, de Philip Kaufman. Talvez tenha até algo de John Ford na amargura e dor do soldado Ira Hayes (Adam Beach) – o índio não suporta ser chamado de herói quando não há o que celebrar. Há um significado trágico nessa vergonha dentro de sua alma. Adam Beach tem dois momentos gloriosos – a cena em que ele está sentado na cama e desabafa com um oficial é de cortar o coração. A outra é aquela em que ele anda sem rumo pela estrada. Beach pode não ser extraordinário, mas Clint tira dele o que bem entende e seu esforço é admirável. Alguns podem reclamar do elenco, mas a escolha se justifica pela inocência dos soldados diante do horror do conflito e, principalmente, da vida após a guerra. Ou seja, gente aparentemente despreparada para lidar com as emoções.

A Conquista da Honra fica ainda melhor quando vemos Cartas de Iwo Jima na seqüência. O primeiro é o conflito sob o ponto de vista dos americanos, enquanto o segundo tenta conhecer o lado inimigo, o japonês. O respeito é tanto, que Eastwood quase não mostra o exército japonês em A Conquista da Honra. O inimigo aqui é a guerra em si. O diretor mostra que não há vencedores, apenas um sofrimento para o resto da vida. Se há um inimigo de carne e osso em A Conquista da Honra, ele é o governo americano. Eastwood olha para o passado para analisar o presente. É uma paulada na política de George W. Bush – ele não deve ter gostado do filme.

Há essa crítica política, mas é a arte que impera. A cena final é Clint Eastwood provando que homem chora em filme de guerra. E Cartas de Iwo Jima é ainda melhor. Mas é como Os Imperdoáveis, Sobre Meninos e Lobos e Menina de Ouro. Difícil dizer qual é o melhor. Vai do gosto de cada um. No momento, só posso dizer que A Conquista da Honra é o primeiro grande filme do ano.


A Conquista da Honra (Flags of our Fathers, 2006)
Direção: Clint Eastwood
Elenco: Ryan Phillippe, Jesse Bradford, Adam Beach, Barry Pepper, John Benjamin Hickey, John Slattery, Paul Walker e Jamie Bell

Os principais filmes do Festival de Berlim

A direção do 57º Festival de Cinema de Berlim apresentou a seleção oficial dos 26 filmes em exibição de 8 a 18 de fevereiro. Apenas seis produções não concorrem ao Urso de Ouro, entre elas o aguardado 300, de Zack Snyder – acho que é a estréia mundial. Alguém me corrija se eu estiver enganado. Outro filme badalado fora de competição é Cartas de Iwo Jima, de Clint Eastwood. Já o brasileiro O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias, de Cao Hamburger, concorre ao prêmio máximo.

O presidente do Júri Oficial será Paul Schrader, o diretor de Gigolô Americano e roteirista de Taxi Driver e Touro Indomável. Ele lidera uma lista composta por nomes como Gael Garcia Bernal e Willem Dafoe. Jennifer Lopez, Clint Eastwood, Robert De Niro, Gérard Depardieu, Matt Damon, Cate Blanchett, Judi Dench e Antonio Banderas são alguns famosos confirmados para desfilar no tapete vermelho.


Abaixo, a lista por ordem de projeção:

La Môme - La Vie en Rose, de Olivier Dahan (França)

O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias, de Cao Hamburger (Brasil)

O Segredo de Berlim, de Steven Soderbergh (EUA)

Sai bo gu ji man gwen chan a, de Chan-wook Park (Coréia do Sul)

Tu ya de hun shi, de Wang Quan'an (China)

O Bom Pastor, de Robert De Niro (EUA)

Die Fälscher (Os Falsificadores), de Stefan Ruzowitzky (Alemanha/Áustria)

In Memoria di Me (Em Minha Memória), de Saverio Costanzo (Itália)

Goodbye Bafana (Adeus, Bafana), de Bille August (Alemanha/Bélgica/França)

Cartas de Iwo Jima, de Clint Eastwood (EUA) - fora de competição

When a Man Falls in the Forest, de Ryan Eslinger (EUA/Alemanha/Canadá)

Notes on a Scandal, de Richard Eyre (EUA/Reino Unido) - fora de competição

Les Témoins (As testemunhas), de André Téchiné (França)

El Otro, de Ariel Rotter (Argentina/França/Alemanha)

Irina Palm, de Sam Garbarski (Bélgica/Alemanha/Luxemburgo/Reino Unido/França)

The Walker, de Paul Schrader (EUA/Reino Unido) - fora de competição

Beaufort, de Joseph Cedar (Israel)

Yella, de Christian Petzold (Alemanha)

300, de Zack Snyder (EUA) - fora de competição

Hyazgar (Sonho de Deserto), de Zhang Lu (Mongólia/Coréia do Sul)

Bordertown, de Gregory Nava (EUA)

Ne Touchez Pas à la Hache, de Jacques Rivette (França)

Ping Guo (Perdido em Pequim), de Li Yu (China)

Obsluhoval jsem Anglického Krále, Jirí Menzel (República Tcheca/Eslováquia)

Hallam Foe, de David Mackenzie (Reino Unido)

Angel, de François Ozon (França)